domingo, maio 27, 2007

"Still Life" de Jia Zhang-Ke

“Still Life” o filme de Jia Zhang-Ke (n.1970), em exibição nas nossas salas de cinema, é mais uma das obras primas do cinema provocada por um olhar fotográfico.


O continuado crescimento económico da China tem levado as grandes potências internacionais a olharem com preocupação para este ritmo demasiado elevado que poderá levar a um sobreaquecimento económico. Na última semana Europa e Estados Unidos pressionaram as autoridades chinesas a valorizarem o yuan. Para os EUA o agravamento do seu défice externo deve-se à China. Mas economistas e políticos têm a memória curta. Há precisamente dez anos, quando as divisas dos países asiáticos desvalorizavam mais de 80%, não foi a China que manteve a paridade do yuan com o dólar? Mas a preocupação não está só na economia, todos inclusive os próprios chineses receiam o pior, o sobreaquecimento do nosso planeta, causado pela poluição.
A China está hoje na mira de todos, inclusive dos fotógrafos. Edward Burtynsky (n.1955) fotógrafo canadiano interessa-se em documentar as transformações que ocorrem no país. Em 2002, a monumental construção da barragem das três gargantas, a maior no mundo, leva Burtynsky a fotografa-la.
Edward Burtynsky, Projecto da Barragem das três gargantas #3, rio Yangtze, China 2002
Construída para controlar as enchentes do rio Yangtze, prevê-se a finalização em 2009.
Uma das fotografias da série Feng Jie esteve recentemente exposta em INGenuidades, na Fundação Gulbenkian.
Edward Burtynsky, Projecto da Barragem das três gargantas, Feng Jie #7, Rio Yangtsé, China 2002.
Em 2002, quando Burtynsky a tirou, a barragem ainda estáva em construção, só em Junho de 2003 começou a encher. A fotografia de Burtynsky mostra ainda a aridez do local. Jorge Calado, comissário da exposição, sábiamente pô-la ao lado de “Enchendo a barragem de Murchison na Tasmânia“, 1982, de David Stephenson, atenuando assim a secura de Feng Jie.
Exposição INGenuidades, Gulbenkian, Abril 2007

Sanming, vem da província Shanxi à procura de mulher e filha em Feng Jie. Passaram dezasseis anos, e Sanming desconhecia o que o esperava. “Still Life”, inicia com Sanming a olhar para Feng Jie submerso.
"Still Life"
A tarefa é agora difícil, mulher e filha foram desalojadas para outros locais. Do vale seco que Burtynsky fotografou, já nada resta. Sanming, emprega-se na demolição dos edifícios, os próximos a serem atingidos com a nova enchente da barragem, e enquanto espera trabalha. Sem ser documentário, “Still Life” também não é ficção, é antes uma contemplação documental do meio envolvente conseguida pela magnífica fotografia de Yu Lik-Wai.
Do filme "Still Life"
Em todos os grandes planos visualizamos a barragem, construção que no final totalizará, tal como o destino da mulher e filha de Sanming, o desalojamento de 1,3 milhões de pessoas.
Zhang-Ke, filma o que a nova geração fotografa, a complementaridade entre cinema e fotografia na China actual é perfeita. O filme é silencioso, como silenciosa é a espera de Sanming. É na dualidade dos contrastes que Zhang-Ke imprime ritmo ao seu filme. A monumentalização da destruição contrasta com a monumentalização das novas construções, a paciência da geração velha e a impaciência da geração nova, 50 yuan por mês ganha Sanming nas demolições, 50 yuan é o que o jovem amigo de Sanming quer ganhar ao dia mesmo que isso lhe custe a vida.
Zhang-Ke, cruza no filme uma outra vida, a de Shen Hong,
"Still Life"
que vem também de Shanxi à procura do marido, que partiu há dois anos. A fábrica onde o marido trabalhava está agora desactivada,
Edward Burtynsky, Fábricas desactivadas #6, Shenyang Machinery Group, Tiexi District, Shenyang City, Liaoning Province, China, 2005
mas Shen Hong não quer esperar, e procura o amigo Dongming para a ajudar. Encontra-o nas escavações arqueológicas, é a civilização de dinastias seculares que em breve estará submersa.
O reencontro de Sanming com a mulher é num barco junto à barragem, mas a reconciliação tem como local um edifício semi-demolido, onde as torres das novas construções se vêem ao fundo.
Sze Tsung Leong, Jiefangbei, Yuzhang District, Chongqing, China, 2003

Shen Hong, reencontra-se com o marido num cais junto à barragem, mas é a ruptura, é o regresso a Shanxi com o papel do divórcio.

A arte contêmporanea chinesa tem uma presença cada vez maior em todo o mundo, através de leilões, exposições, feiras, bienais...veja-se alguns exemplos do que está em exposição, Working Progress de Ai Weiwei e Kake Studio na Tate Liverpool, enquadrado na PhotoEspaña 2007 podem –se ver os trabalhos de Zhang Dali. “Zhù Yí! Fotografia actual en China” pode-se visitar no ARTIUM em Vitória, Espanha...Zhù Yí significa ATENÇÃO em mandarim.

Zhù Yí, é a mensagem de todos ,do filme “Still Life” de Jia Zhang-Ke às fotografias de Edward Burtynsky.