sábado, agosto 30, 2008

A Rússia de Putin

Será que Putin e Medvedev vão por a GAZ, a fábrica de automóveis Gorky, novamente a fabricar os “Chaikas”, o carro que durante os anos de 1951-1981, serviu exclusivamente os membros do governo da URSS?


Victor Akhlomov, Chaikas - Kalininski prospect, 1970


Será que Putin e Medvedev vão escolher como destino de férias a Abkhásia, junto às margens do Mar Negro, como outrora a antiga elite da URSS?

Eric Baudelaire, Abkhásia, 2005

Será que Putin e Medvedev, querem recomeçar uma nova Guerra Fria, como a que se iniciou em 1949, entre os EUA e a URSS?
Será que Putin e Medvedev querem transformar a Rússia na ex-URSS?

Com o virar do século, o mundo aproximou-se do fim da era do petróleo barato. Julgar que os combustíveis alternativos são a solução que nos permite manter em funcionamento a nossa infra-estrutura quotidiana é ainda uma miragem. A transição suave e sem interrupções dos combustíveis fosseis para os seus pretensos substitutos – o hidrogénio, a energia solar…que todos nós ardentemente desejamos, está muito longe da realidade. O petróleo, agora utilizado por muitos mais milhões de pessoas, aproxima-se da depleção e o conflito entre a Rússia e o Ocidente, que durante todo o mês de Agosto encheu as páginas dos jornais, não é de estranhar, a Rússia de Putin, que enriqueceu com o petróleo e o gás, julga-se uma nova potência capaz de desafiar o Ocidente. Será?

Regressemos aos “Chaikas”, às limousines russas, que bebiam gulosas, litros e litros de combustível. Em plena Guerra Fria, a Ford e a GAZ, trabalhavam em cooperação. O modelo Ford A, era vendido na União Soviética como o modelo GAZ A. Seguiu-se o modelo Ford V8 que a GAZ produzia como GAZ M1. Com a experiência, os soviéticos começaram a fabricar os seus próprios modelos, e os Volgas, 1956, conhecidos como o GAZ 21, marcaram uma era e encheram as ruas das cidades.


Victor Akhlomov, The state plan, Marx prospekt, Moscow

Os célebres “Chaikas”, que hoje se vendem a preços exorbitantes nos leilões Ocidentais, eram exclusivos dos membros do governo e a sua venda era interdita a qualquer um. Inspirado, como todos os outros modelos, no design americano,





os “Chaikas” eram também apetrechados com toda a tecnologia inventada em Detroit - janelas eléctricas, faróis de nevoeiro, rádio incorporado…Hoje, em Moscovo, limousines fabricadas no Ocidente, de vidros fumados, não deixam ver quem entra no Kremlin, será Putin, Medvedev?


Andras Fekete, Moscow, Estabilishing Shots

Os velhos “Chaikas”, que Nikita Khrushchev tanto gostava, não passam de relíquias do passado, mas as novas limousines, encomendadas no Ocidente, continuam restritas ao clã dos que governam agora a Rússia.

Na era do petróleo barato, a tecnologia americana foi a grande mais valia, e anedotas como esta: “How do you double a Lada’s value?”, cuja resposta “Fill up the tank”, fazia rir os Ocidentais, não está hoje longe da verdade. Se o petróleo que enche os carros são o grande valor da Rússia, a tecnologia, a grande mais valia, continua a vir da América. Será que Putin cairá no erro de Khrushchev que em 1958 dizia “ultrapassaremos os americanos em 1970”?


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terça-feira, agosto 26, 2008

Os subúrbios americanos

“Psycho”, (1960), o último filme a preto e branco de Hitchcock, que passou recentemente na Cinemateca, inicia com um plano geral de uma cidade americana igual a tantas outras.

Robert Adams, do livro "The New West", 1974


Com uma precisão pouco habitual nos seus filmes, Hitchcock localiza-nos no espaço e no tempo: estamos em Phoenix, no Arizona e são 2:43 da tarde de uma sexta-feira de Dezembro. O detalhe da hora, explicou o realizador a Truffaut, é importante, porque assim o espectador é informado que aquela é a única altura em que a rapariga, Marion, que trabalha numa imobiliária, pode ir para a cama com o amante. De plano em plano, de telhado em telhado, de prédio em prédio, acabamos por entrar, através de uma janela no quarto de Marion.

Robert Adams, do livro "The New West", 1974

No escritório, ao qual regressa sem almoçar, um cliente paga em notas a casa que acaba de comprar para a filha. O fim-de-semana está à porta, 40.000 dólares é muito dinheiro para ficar no cofre da agência e Marion, seguindo a ordem do patrão deverá depositá-lo no banco. Tanto dinheiro num envelope é tentador, e de transgressão em transgressão, Marion decide rouba-lo e fugir. De carro, saímos de Phoenix com Marion ao volante e seguimos por uma estrada deserta rodeada por campos de algodão.

Robert Adams, do livro "The New West", 1974

Hoje, se Marion ressuscitasse e regressasse à “route 347”, não a reconheceria - filas e filas de casas todas iguais com piscinas e relvas sintéticas pululam no que era, ainda há uns anos atrás um deserto.

Robert Adams, do livro "The New West", 1974


Robert Adams, do livro "The New West", 1974

Phoenix foi das cidades que mais cresceu com o recente “boom” imobiliário e tornou-se “an obvious place to open a bank”, disse há dias o presidente do Arizona Bankers Association numa entrevista. De ano para ano Phoenix viu crescer centenas de novos bancos, o montante dos depósitos passou dos 43 mil milhões de dólares em 2000 para 80 mil milhões em 2007, aumento que justificou a proliferação do negócio. Se os 40.000 dólares tentaram Marion, o lucro fácil obtido nos empréstimos para a construção, o principal negócio em que a banca se transformou, enriqueceu todos durante sete anos até que a bolha rebentou. Agora Maricopa, um dos subúrbios de Phoenix, como tantos outros subúrbios da América, vive as consequências dos excessos: empréstimos sobre activos que não existem – casas que nunca chegaram a ser construídas ou que estão inacabadas


Robert Adams, do livro "The New West", 1974


Robert Adams, do livro "The New West", 1974

levaram à falência bancos, construtores e os proprietários que compraram as suas novas mansões vêem-se agora aflitos e enganados, por pagarem muito mais pelo seu valor real. Casas vazias, com tabuletas indicando “for sale” vêem-se por todo o lado,

Robert Adams, do livro "The New West", 1974

o deserto regressou aos subúrbios, mas o cimento e o betão transformaram a paisagem.


Robert Adams, do livro "The New West", 1974

O Oeste que o fotógrafo Robert Adams, (n.1937) ainda conheceu – uma terra de espaço livre,

Robert Adams, do livro "The New West", 1974

há muito que entrou em declínio. Adams doutorado em literatura inglesa, deixou o ensino pela fotografia e no início dos anos 70, empenhado nas questões do ambiente, fotografou a transformação das paisagens do Colorado ao Oregon, que deixou registado no livro “The New West”, 1974, que este ano a Aperture reeditou. A sobrepopulação com a construção das “tract homes” nos subúrbios preocuparam-no profundamente.


Robert Adams, do livro "The New West", 1974

Marion foge da cidade, de Phoenix e num motel,

Robert Adams, do livro "The New West", 1974

perdido numa estrada que passou a secundária, procura uma noite de descanso, mas em lugar encontra o terror e a morte.
Agora para fugir ao terror dos subúrbios os americanos regressam à cidade, e os carros que há pouco ocupavam as garagens das casas são substituídos pelos transportes públicos, “os americanos tornam-se cada vez mais europeus”, escreveu recentemente um ambientalista no Washington Post.
Os subúrbios já não tem futuro, apenas uma história, como a história de “Psyco” que termina tal como os subúrbios num vazio total, onde todo o horror parece afinal não ter culpado.

Robert Adams, do livro "The New West", 1974


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quarta-feira, agosto 20, 2008

BTC: Bakou - Tbilissi - Ceyhan


Yann Mingard, Cazaquistão, 2005

Ontem a Aliança Atlântica –NATO, avisou Moscovo que as suas tropas estão próximas de Tbilissi e diz que o futuro das relações com a Rússia depende das acções concretas de Dmitri Medvedev honrar as promessas feitas. O Presidente russo, em resposta, afirmou ao seu homólogo francês, Nicolas Sarkozy, que irá cumprir o cessar-fogo entre a Geórgia e a Rússia, assinado Sábado passado, e que irá retirar, entre amanhã e depois, as suas tropas que ainda estão na Geórgia. Claramente os russos dominam as operações e sabem-no bem.

No dia em que inesperadamente o muro de Berlim ruiu, 9 de Novembro de 1989, o porta-voz do ministério dos negócios estrangeiros soviético, M. Guenadi Guerassimov afirmou: “todas estas mudanças vão na boa direcção. Evoluímos de uma Europa dividida do pós-guerra para uma casa comum europeia”. Mas como vimos no post anterior, foi esta abertura a uma política europeia, promovida por Mikhaïl Gorbatchev, que do apogeu o levou ao declínio. Boris Yeltsin, que lhe sucedeu, viu-se à frente de uma República Soviética Russa destituída de poder - a antiga e poderosa União Soviética desmoronara-se e em lugar dezenas de novos Estados proclamavam a sua independência. Se num primeiro momento a divisão militar se manteve entre a Aliança Atlântica, NATO, e o pacto de Varsóvia - não esqueçamos que em vésperas da formação do governo, Agosto de 1989, Lech Walesa afirmava na televisão que a sua Polónia se manteria fiel ao pacto de Varsóvia - meses depois, este mesmo pacto que constituía um dos principais atributos do poder internacional da URSS, e conferia a divisão de um equilíbrio militar mundial, também ele implodia juntamente com todo o sistema ideológico, político e militar da União. O pacto de Varsóvia via-se destituído de todo o seu significado, quer no plano político como militar, e a Rússia de Yeltsin, com as forças armadas num estado de profunda decadência, estava longe de ser uma ameaça para a Europa. Contudo Moscovo ambicionava implicar-se de forma mais directa nas tomadas de decisão intra-europeias, nomeadamente na NATO, OMC…mas a Europa, perante uma Rússia que via decadente virou-lhe as costas e mostrou-se bem ingrata não só com o iniciador da “perestroïka” como com Yeltsin, o seu sucessor, que tentava salvar o país da penúria e pedia desesperadamente ajuda ao Ocidente - um verdadeiro auxílio nunca chegou. Passados uns anos, e com o aumento exponencial do preço das matérias-primas, gás e petróleo, o feitiço virou-se contra o feiticeiro, e hoje é a Europa, presidida por Durão Barroso, que de joelhos implora e mendiga à Rússia o seu gás que tanto precisa, como assistimos na recente cimeira de Julho em Khanti-Mansiik, na Sibéria, nas negociações para um novo pacto estratégico.
Agora é Putin que não está interessado na União Europeia e utiliza o gás e o petróleo, que circulam nos seus oleodutos para mostrar o seu novo poder.

Regressemos à região do Cáucaso, ao Cazaquistão, outra República da antiga URSS, onde em Kashagan, no norte do mar Cáspio se descobriu, em 2000, uma das maiores jazidas petrolíferas do mundo.

Yann Mingard, Mar Cáspio, Cazaquistão, 2005

Debaixo do espesso gelo do mar, a exploração do enorme campo petrolífero já começou.

Yann Mingard, Mar Cáspio, Cazaquistão, 2005

Os desafios técnicos para extrair o ouro negro a mais de 4500 metros de profundidade, nesse mar de gelo, estão a tornar o projecto no mais caro da história do petróleo.

Yann Mingard, Cazaquistão, 2005

O investimento avultado obrigou a Kazmunaygas, a companhia estatal do Cazaquistão, a aliar-se, num consórcio internacional, à Shell, Exxon Mobil, Eni e Inpex. A cidade de Atyrau, a 75 Km do campo de Kashagan, transforma-se de dia para dia,

Yann Mingard,Atyrau,Cazaquistão, 2005


Yann Mingard,Atyrau,Cazaquistão, 2005

e de uma terra sem ninguém é hoje a capital do petróleo do Cazaquistão.

Yann Mingard,Atyrau,Cazaquistão, 2005

Em construção já estão os oleodutos que ligaram Kashagan ao BTC – Bakou – Tbilissi – Ceyhan, o oleoduto alternativo à Rússia e ao Irão.

Yann Mingard,Cazaquistão, 2005

A espera já não é longa, estima-se que em 2010, nesses oleodutos circulem o correspondente a 1,2-1,5 milhões de barris de petróleo por dia.
Tbilissi, na rota do BTC, interessa a todos: à Rússia que quer manter a sua soberania e à União Europeia que se quer ver livre do actual e único vendedor de gás.

O conflito na Geórgia, que já causou milhares de mortes e desalojados está longe de estar resolvido, porque novamente o petróleo irá comandar as operações no terreno.

A Europa, que se julga uma nova potência, continua sem estratégia, sem saber o que quer

Yann Mingard,Cazaquistão, 2005

e quando o muro ruiu, começou o seu drama – onde termina a Europa? onde começa a Ásia?

Agora é a Turquia que mendiga à Europa a sua integração. Os burocratas de Bruxelas prolongam-se em hesitações, e para ganharem tempo pedem ao país alterações à constituição de forma a aproximar a Turquia dos valores culturais europeus. A Turquia fez o trabalho de casa, e em 2003 o parlamento turco aprovou as alterações pedidas. Contudo a Europa continua indecisa, se a Turquia entra para a União Europeia, a Geórgia, a Arménia, o Irão, o Iraque e a Síria serão os novos vizinhos, e a Europa, a que se julga uma nova potência, teme pela sua segurança. Entretanto os turcos, uma nação outrora imperial, sente-se humilhada, e não tarda que à semelhança da Rússia a Europa veja as consequências das suas hesitações…


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sexta-feira, agosto 15, 2008

As ex-Repúblicas da URSS

A 2 de Maio de 1945 as tropas russas entravam em Berlim. No telhado do Reichstag, o fotógrafo que trabalhava para a agência Tass, Evgueni Khaldei,(1917-1997), encenava dias depois, a fotografia que viria a tornar-se no símbolo da derrota do nazismo. A Europa, outrora o centro do Mundo, reduzia-se a um mero enclave entre Washington e Moscovo.

Evgueni Khaldei, Moscovo, c.1950, Col. Ernst Volland

Nesses anos, Moscovo, que vivia fechada do resto do mundo, olhava então para si, para a sua grandeza, tal como Khaldei a fotografou nesses gloriosos anos que se seguiram à Segunda Grande Guerra.


Evgueni Khaldei, Moscovo, c.1950, Col. Ernst Volland


Evgueni Khaldei, Fábrica de turbinas em Leningrad, 1960, Col. Ernst Volland


Evgueni Khaldei, Moscovo, 1970, Col. Ernst Volland

As duas potências mundiais, URSS e a América, desafiavam-se. A 12 de Abril de 1961, Iouri Gasgarine, o astronauta soviético, efectuava o primeiro voo no espaço, por sua vez, o astronauta americano, Neil Armstrong, pisava pela primeira vez o solo lunar a 20 de Julho de 1969.

Evgueni Khaldei, escultura do astronauta Iouri Gasgarine, 1963, Col. Ernst Volland

A 9 de Novembro de 1989, o muro, que separava a cidade de Berlim ruía – Mikhaïl Gorbatchev, provava, pela tolerância que demonstrava nas negociações da reunificação alemã, não só a sua vontade de por fim à guerra fria como de transformar a Europa numa nova ordem. Espantosamente a Europa, de Thatcher a Mitterand, temeu o colapso da organização estável e familiar que conheciam, e a primeira reacção, depois da euforia dos primeiros dias, foi bloquear a unificação proposta por Helmut Kohl, que percebeu a urgência da unificação do país.

Ao ceder à Alemanha, Gorbachev contribuía para o seu próprio declínio e de facto, uma Alemanha unida no seio da NATO, foi o fim da sua “perestroika”. O rastilho da independência não só se estendeu aos restantes Estados-satélites do Leste europeu, como se alastrou dentro das suas próprias fronteiras. Em 1922, a União Soviética crescera anexando muitos dos territórios estrangeiros à Rússia e estendia-se por uma área com onze fusos horários e dezenas de povos diferentes.

Legenda


A complexidade étnica deste enorme país gerava agora ondas de protesto, sobretudo por questões de língua e nacionalidade, e muitas regiões da Ásia Central e do Cáucaso, reivindicavam a sua independência nacional e a secessão da União. Se o Cazaquistão, Quirguistão, Tajiquistão, Turquemenistão e Uzbequistão cobriam entre si uma grande parte do território soviético, não eram aos olhos da URSS muito importantes pois apresentavam à época um Produto Interno Bruto (PIB), que no conjunto, não era superior a 9%, o mesmo não se passava com a Ucrânia,

Evgueni Khaldei, Ucrânia, 1966, Col. Ernst Volland

a Geórgia e a suas vizinhas Arménia e Azerbaijão,

Evgueni Khaldei, Azerbaijão, 1959, Col. Ernst Volland

que para além do elevado PIB, (a Ucrânia gerava à época 17% do PIB total) e dos recursos naturais, a localização estratégica, com vias de acesso ao Mar Negro bem como à Europa Central era vista como vital. A posição de Gorbachev, que hesitava entre o ideal e o possível e procurava um federalismo controlado, tornou-se para os seus colegas da linha dura insustentável. A 17 de Agosto de 1991, de férias na Crimeia, o líder Gorbachev era alvo de um golpe de estado. A Europa, também de férias, lia nas primeiras páginas dos jornais que o presidente estava impossibilitado de exercer as suas funções por razões de saúde. Boris Yeltsin, eleito presidente da República Soviética da Rússia, em 12 de Junho de 1991, aproveitou o momento para salvar a situação. Gorbachev, regressava a Moscovo e ultrapassado pela História sem o saber, acabaria por ceder, nos dias seguintes, à declaração de independência de todas estas repúblicas, que seguiram o exemplo das repúblicas do Báltico.

Evgueni Khaldei, estátua de Estaline, canal do Volga em Don, 1952, Col. Ernst Volland

A URSS era agora um Estado oco, vazio de poder e recursos. No dia de Natal desse ano, a bandeira russa, substituiu a insígnia soviética no cimo do Kremlin, a mesma que em 1945 Khaldei fotografara no telhado do Reichstag.

Evgueni Khaldei, Reichtag, Berlim, 1945

No Kremlin, Gorbachev cedia o seu gabinete a Yeltsin.

Um grande Estado industrial – uma superpotência militar – simplesmente caía e embora o desmoronamento da União Soviética não fosse inteiramente desprovido de violência - no Cáucaso rebentaram alguns conflitos - não houve uma guerra, uma revolução sangrenta, a explosão do barril de pólvora era adiado.

Agora o cessar-fogo na região da Geórgia está muito longe da paz desejável, e não é o futuro das diferentes etnias das regiões separatistas da Ossétia do Sul e da Abkházia que preocupa os políticos, mas a localização estratégica destas regiões, mas isso veremos no próximo post.


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sábado, agosto 09, 2008

Airbus A380


Mark Power, da série Airbus A380, 2005

Ontem testemunhámos, ao ver a abertura dos Jogos Olímpicos na China, a uma libertação louca de energia que foi gerada ao longo de anos de aspirações reprimidas. Os chineses estão orgulhosos do seu país, e têm razão para o estar. Num curto espaço de tempo a China, passou de um país economicamente fechado e pobre, para uma economia aberta e em ligação com o mundo. Há poucos anos atrás, a população que vivia nas cidades nem telefone tinha em casa. Agora, a nova geração, ultrapassou as comunicações por cabo e passaram directamente para os telemóveis e Internet sem fios. Tudo acontece tão rapidamente que a ligação com o mundo parece irreversível.

No final do século XX o mundo económico global abrangia a América do Norte a Europa Ocidental e o Japão, enquanto a Índia, China, Rússia e Europa de Leste caminhavam para uma economia de mercado. Com o virar do século, a população total deste mundo económico global, que participava nas trocas e no comércio internacional,

Mark Power, da série Airbus A380, 2004

passou dos 2,5 mil milhões de pessoas para os seis mil milhões. Se há precisamente dez anos os índices BSE Sensex da Índia e o Shanghai 180 da China ficavam imunes ao colapso das bolsas mundiais, ontem, no dia da abertura dos jogos, o índice Shanghai 180 fechava com um perca de 4,67% que soma aos 50% de quebra desde o inicio do ano. Nenhum mercado fica agora imune ao que se passa no mundo e os investidores antecipam, depois de sete anos esfusiantes, de uma quebra na produção. A crescente capacidade de efectuar transacções e correr riscos em qualquer parte do mundo criou uma economia verdadeiramente global, e hoje, não são só as bolsas de valores que se globalizaram mas o mundo.
Contudo a velocidade estonteante como tudo está a mudar destabilizou o planeta, que agora não sabe como enfrentar tão grandes desafios.

Mark Power, da série Airbus A380, 2004

Nos anos de transição, os países em vias de desenvolvimento inundaram o mercado com uma mão-de-obra barata, e na Europa, muitas fábricas encerraram e deslocaram-se para esses locais.

Mark Power, da série Airbus A380, 2004

As multinacionais cujo objectivo é criarem uma empresa sustentável, ultrapassavam os interesses do Estado-nação onde estavam sediadas, e os políticos europeus, alheados ao que se passava, foram apanhados desprevenidos. Olharam e viram na globalização, não um desafio, mas um mal a eliminar.
A perspectiva e predisposição dos políticos é extremamente importante na configuração daquilo que vêem e não vêem, e é isso que ajuda a explicar porque não deram conta que algo importante estava a acontecer no mundo.

Mark Power, da série Airbus A380, 2004

Mark Power, quando aceitou fotografar o projecto de construção do maior avião comercial, o Airbus A380, defrontou-se com o problema de produção das várias peças em diferentes locais geográficos. A fuselagem foi feita na Alemanha e na França,

Mark Power, da série Airbus A380, 2004

a cauda em Espanha,

Mark Power, da série Airbus A380, 2004

Mark Power, da série Airbus A380, 2004

as asas no País de Gales,

Mark Power, da série Airbus A380, 2004

e o resto, que é enorme,

Mark Power, da série Airbus A380, 2004

em pequenas fábricas espalhadas pela Holanda, Bélgica e Itália. Mas certas partes do avião eram tão grandes, que não podiam ser transportadas pelos transportadores aéreos e marítimos existentes. Foi então necessário, construir em Xangai, um navio – Ville de Bordeaux, que recolheu de porto em porto, todas as partes do avião e transportou-as até Paulliac perto de Bordéus.

Mark Power, da série Airbus A380, 2004

Daí seguiram até o hangar de Toulouse,

Mark Power, da série Airbus A380, 2004

onde se procedeu finalmente à montagem. No ano em que terminou a construção do A380, 2005, o japonês, Glen Fukushima, que aceitara o lugar de presidente de operações no Japão via a empresa nestes termos: “Já não existe qualquer correlação entre a nacionalidade dos executivos de uma empresa global, a localização geográfica da sede da empresa e o mercado onde os seus executivos de topo estão a realizar os seus negócios mais importantes,…estou a fazer algo de novo e diferente que reflecte o tempo em que vivemos e que desafia as categorias nacionais muito arrumadinhas”.

Mark Power, da série Airbus A380, 2004

A Boeing, a grande concorrente da Airbus, há anos que recorre a engenheiros e cientistas russos de forma a tirar partido dos seus conhecimentos periciais em aerodinâmica e novas ligas para aviões. Agora, estes engenheiros russos ajudam a empresa aeronáutica a desenhar a nova geração de aviões de passageiros e para isso, abriram em Moscovo um gabinete de design de engenharia aeronáutica. Os engenheiros russos colaboram, assistidos por computadores, no design de aviões com os seus colegas da Boeing em Seattle e no Kansas. Utilizando os cabos de fibra óptica e software aeronáutico, os engenheiros enviam os seus fluxos de trabalho da Rússia para a América e vice versa.

Todo este movimento de recrutamento global tem como objectivo acelerar e tornar os aviões o mais barato possível e conseguir sobreviver à concorrência, na Airbus e na Boeing ninguém está a dormir…

Mark Power, da série Airbus A380, 2004

Nos dias de hoje identificar o país de origem de uma empresa é cada vez mais difícil.
Será a Airbus uma empresa francesa? ou será que a Airbus se sente mais ligada ao local onde se fabricam os motores? onde se desenham as asas?...

São muitas as multinacionais que ainda hoje procuram a mão-de-obra barata da China, onde nas cadeias de produção fabricam parte do produto final. Os milhares de chineses que trabalham nessas cadeias são mal pagos, pois na China fica pouco mais que 3% da mais valia total, mas certamente não será por muito tempo, o “made in China” das cadeias de produção em breve será lembrado como um período de transição. Os líderes chineses agora preparam-se para colocar a China a desenhar também as asas de aviões, pois sabem que as empresas para se manterem globalmente competitivas precisam de ser inovadoras. Elevar a educação e a formação é hoje uma aposta real na China. Num mundo que se globalizou, ninguém pode dormir descansado, e a China decidiu explorar a massa cinzenta do seu povo, facultando instrução a uma fatia alargada da sua população.

Em Portugal, centenas de alunos concorrem, através do Erasmus, a outras universidades no intuito de melhorarem os seus conhecimentos, mas o descalabro no ensino básico é gritante e o país não pode adormecer à espera que os chineses venham construir os TGV, pontes e as auto-estradas. É bom que se destape a cortina...

Mark Power, da série Airbus A380, 2004

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