domingo, maio 13, 2007

Economia e Fotografia

“Bolsas chinesas deixam resto da Ásia de olhos em bico” é o título de um dos artigos do último Diário Económico. O jornal ilustra-o com esta fotografia.

Logo nos lembramos de Andreas Gursky que fotografou muitas bolsas asiáticas.
Andreas Gursky, Tokyo Stock Exchange, 1990


Andreas Gursky, Hong Kong Stock Exchange, Díptico, 1994

A Areva e a dupla Suzlon/Martifer disputavam sexta-feira passada o preço de oferta que decidirá o desfecho da OPA sobre a empresa alemã REpower. Quem oferecer mais dinheiro sairá vencedor. O consórcio Suzlon/Martifer, a Suzlon indiana a Martifer portuguesa já detém uma participação na REpower. A Areva, empresa francesa totalmente controlada pelo Estado detém 29% do capital da REpower. A Areva é o maior produtor mundial de centrais nucleares. Centrais nucleares funcionam com torres de arrefecimento. A maior parte de nós, conhece as centrais nucleares e torres de arrefecimento através das imagens fotográficas,

Michael Kenna, Central Térmica de Ractcliffe, Estudo 52, Nottingamshire, Inglaterra, 2000
como esta de Michael Kenna que logo me veio à memória por a ter visto recentemente na exposição Ingenuidades. Mas para além das imagens fotográficas temos também imagens gráficas, por exemplo a valorização da REpower em bolsa.

Imagens gráficas de índices bolsistas, lembram o fisiologista Etienne-Jules Marey, hoje mais conhecido como o fotógrafo que registou o movimento.
A imagem gráfica não nos dá a realidade, não é mimética, é antes uma transformação métrica de determinados fenómenos inacessíveis aos nossos sentidos. Os registos gráficos desenvolveram-se no início do século XIX e eram uma novidade, por exemplo uma frase podia ser representada por um conjunto de curvas como também o inverso, (ondas radiofónicas) aplicadas a um aparelho vibrador restituiam uma frase sonora. Estes mecanismos de registo produziam imagens totalmente novas.
Estudo fisiológico da voz humana, M.Piltan, 1887
Marey, enquanto fisiologista e homem das ciências foi dos primeiros a escrever sobre o assunto. Em 1878 escreveu “La méthode graphique dans les sciences expérimentales”.
No livro Marey ilustrava através de gráficos, fenómenos físicos complexos, difíceis de explicar ou mostrar. Construiu diversos aparelhos que de forma mecânica captavam , mediam e transmitiam traços que constituiam os registos gráficos.
Étienne-Jules Marey, Excitações sucessivas no músculo de uma rã do livro La Méthode Graphique.
Por fenómeno entendia Marey tudo que fosse caracterizado por variações de grandeza física, como dilatação, temperatura, pressão, velocidade do vento, corridas, Bolsa de valores, estatísticas de natalidade..., cuja variação lenta ou rápida, brusca ou contínua, tinha como variável fundamental o tempo. Para ele todos os fenómenos, sejam eles económicos, metereológicos, fisiológicos, estatísticos, biológicos, físicos...eram determinados pelo tempo.
Étienne-Jules Marey, diferentes traços de um mesmo fenómeno fisiológico, pulsações cardiacas, 1894.

Por ser eficaz e útil ao permitir a visibilidade de fenómenos invisíveis, o método gráfico tornou-se numa nova linguagem universal e foi amplamente divulgado mesmo fora dos meios científicos.
A máquina fotográfica foi para Marey como mais um aparelho que lhe permitia registar de forma mecânica e precisa o movimento, por exemplo de um homem a correr durante um determinado tempo. Em 1885 escreve o livro “Développement de la méthode graphique par l’emploi de la photographie”.Em 1887 utiliza o termo cronofotografia para designar as fotografias registadas de forma sucessiva na mesma placa fotográfica.
Étienne-Jules Marey, fotografia representando as diversas fases sucessivas de um homem a correr, do livro "La photographie du mouvement"
Nesta imagem o sujeito em movimento aparece em posições múltiplas em diferentes pontos no espaço.
Contudo para precisar melhor o movimento, Marey fotografa o sujeito todo vestido de preto, em que nos membros e articulações, pertinentes á análise dos movimento da locomoção, pintou linhas e pontos brancos.
Étienne-Jules Marey, Marcha de um homem, trajectória de diferentes articulações, do livro "Développement de la méthode graphique par l'emploi de la photographie".
Étienne_jules Marey, do livro "Mouvement", 1894.
Marey transformou também a fotografia num método gráfico produzindo diagramas de um novo género.
Com o desenvolvimento de placas mais sensíveis á luz, em 1888-89 Marey, deixa a placa única e fotografa em vários momentos (50 fotografias por segundo), o movimento. A imagem global lê-se como uma sequência de imagens elementares que por sua vez são posições reais no espaço e no tempo. A sequência final dá a ideia de movimento.

Alan Greenspan foi durante 17 anos presidente da Reserva Federal Americana. A sua voz monótona e monocórdica tornava difícil seguir os seus discursos. Á semelhança das máquinas construídas por Marey, podiamos seguir o discurso olhando para os três índices americanos Dow Jones, S&P 500 e o Nasdaq. Não precisávamos de o ouvir, bastava olhar para o gráfico destes índices, para saber o que dizia Greenspan se subia, descia ou mantinha as taxas de juro.
Dow Jones, fecho de sexta-feira dia 11 de Maio de 2007
NASDAQ, fecho de sexta-feira dia 11 de Maio de 2007

As imagens gráficas são esquemáticas e simples, e por isso amplamente utilizadas. Por exemplo para mostrar e comparar a nossa economia com outros países da Europa basta um diagrama gráfico, não é preciso texto.
Mas a representação gráfica com a sua aparência minimalista foi arredada durante anos das artes. Só mais tarde artistas como Duchamp, Sol Le Witt, Robert Smithson...olharam para elas como fonte de inspiração, para muitos dos seus trabalhos. Hoje Marey e Muybridge continuam no meio artístico a servir de fonte inspiradora.

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