domingo, março 16, 2008

Silicon Valley

Entramos e saímos de São Francisco por vias rápidas que rasgam irreversivelmente a paisagem.

Gabriele Basilico, São Francisco, 2007
Gabriele Basilico, São Francisco, 2007
Dividida por viadutos, túneis, São Francisco tornou-se numa cidade sem limites, sem princípio nem fim. Silicon Valley, vale que há uns anos era ocupado por agricultores, fica a sul de São Francisco e para lá chegar, é melhor não nos enganarmos na via rápida.
Gabriele Basilico, São Francisco, 2007

Interessado no levantamento do boom tecnológico da região de Silicon Valley, o Museu de Arte Moderna de São Francisco, SFMOMA, convidou, Gabriele Basilico, o arquitecto e fotógrafo milanês, para fotografar a região.
Cerca de 50 fotografias, a preto e branco e a cores, estão agora expostas no museu até ao dia 15 de Junho, sendo esta exposição a primeira de outros projectos sobre a região.

Ao tornar-se agricultor, o homem sedentarizou-se. Durante séculos, na Europa, o homem nascia, vivia e morria na mesma região, só quem vivia à beira de um rio ou junto à costa tinha mais facilidade em se deslocar. Na América, quando o caminho de ferro ligou o Este ao Oeste, os primeiros colonos a chegar à Califórnia sedentarizaram-se, plantaram vinha e outras culturas. Quarenta anos depois, com a invenção do motor de combustão pelos alemães, a febre espalhou-se pelo mundo. Henry Ford, na América, fundava em 1903, a maior companhia do sector.
Charles Sheeler, Ford Plant, Blast Furnace and dust Catcher, 1927
Charles Sheeler, Ford Plant, River Rouge, Criss-Crossed Conveyors, 1927
Charles Sheeler, Ford Plant, River Rouge, c.1930, óleo s/ tela.
Pouco tempo depois, o automóvel proporcionava uma nova mobilidade para qualquer americano, Ford revolucionara o mercado com duas inovações: um modelo utilitário, económico, o célebre Ford T, 1908, e o estabelecimento duma rede, por todo o continente de oficinas de manutenção. Ford foi um verdadeiro empreendedor e revolucionou a indústria e a economia do país, e o carro para o americano passou a ser um prolongamento do seu corpo. Nascer, viver e morrer na mesma região não faz sentido para os americanos.

Em meados da década de 90, outros empreendedores revolucionavam novamente a economia. A rápida expansão das novas tecnologias à medida que a Internet aumentava de velocidade veio alterar de forma profunda e persistente o modo de funcionamento das empresas e a vida de cada um de nós. Silicon Valley foi o local escolhido. As fibras ópticas, os chips, microprocessadores, satélites, substituíram a agricultura.
Matthew Pillsbury, Penelope Umbrico, Monday, Fev 3, 19-19:30 pm, 2003
As empresas de Silicon Valley, ao contrário das grandes indústrias, como a indústria automóvel, estão continuamente a refazer-se. Aparecem e desaparecem a um ritmo incessante. A um ritmo incessante, cresceram todos estes bairros e parques que Basilico fotografou.
Gabriele Basilico, Alviso, 2007
Gabriele Basilico, São José, 2007
Gabriele Basilico, Sunnyvale, 2007
Gabriele Basilico, São José, 2007
Matthew Pillsbury fotografa à noite, utilizando apenas a luz disponível dos ecrãs de computador. Os longos tempos de exposição exigidos, que fazem parte do título da imagem, reduz os corpos a meras presenças fantasmagóricas.
Matthew Pillsbury, Cameron Taylor, Las Vegas, Thuersday, Aug 18, 23:16 - 23:32 pm, 2004
Matthew Pillsbury, Leslie and Ella on the Hudson, Wed, May 31, 9:26 - 9:47 pm, 2006
Hoje a nossa civilização gira à volta do carro e do computador, extensões indispensáveis do nosso corpo, que asseguram a mobilidade e a comunicação instantânea. Basilico olha em volta e fotografa as vias rápidas e os carros que aí circulam, mas o homem fica de fora nas suas fotografias. Matthew Pillsbury, desmaterializa a informação, e reduz o homem a um mero fantasma, uma meditação da dependência do americano à nova indústria de Silicon Valley.

Com as empresas de Silicon Valley, os gigantes, IBM, Hewlett-Packard, AT&T, lutam para acompanhar a tendência, adaptam-se ou morrem, a máxima de Bill Gates. A verdade é que o significado e finalidade da máquina evolui ao longo do tempo. Na geração de 50, o homem da Regisconta, que utilizava as novas máquinas de escrever era o protótipo do homem moderno.
Foto Sport, anúncio do Homem da Regisconta, c.1950
Hoje, na era da Internet, ninguém se lembra das máquinas de escrever, e o computador não só a substituiu como é agora a porta de acesso à mais enciclopédica informação. As empresas passaram a dispor de uma enorme capacidade de adquirir e disseminar informação. As informações em tempo real trazidas pelas tecnologias mais recentes reduzem de maneira evidente as incertezas associadas ao dia a dia. No início do novo século as empresas de Silicon Valley, conseguiram repentinamente grandes lucros, porque o investimento acabou por envolver todo o sistema de Wall Street.

Para termos só uma ideia, o valor de mercado da Google, hoje uma das indústrias de Silicon Valley, que todos nós tão bem conhecemos, era, em 2005, 11 vezes maior que o capital da General Motors (GM). A GM investia os seus próprios fluxos financeiros onde os lucros fossem mais prometedores – e a Google era uma delas. A GM deixou de criar novos produtos e de construir novas fábricas, como fora sempre a sua tradição. Silicon Valley mudou o mundo, e a insegurança de emprego, que costumava afectar mais os operários das fábricas, começou a partir dos anos 90, a afectar pessoas com melhor nível de formação e mais bem pagas. Silicon Valley provocava a destruição dos chamados empregos de colarinho branco, o trabalho administrativo e de secretariado, era absorvido pelo software dos computadores. Agora tudo está em vias de mudar novamente, novas prioridades globais, para um desenvolvimento sustentável do nosso planeta exigem novas tecnologias, tais como a energia limpa, que agora estão na mira dos investidores. Silicon Valley ou se adapta ou morre, ou então corre o risco de se transformar, como Pillsbury transformou o homem, numa mera presença fantasmagórica.
Matthew Pillsbury, Full Moon Rising over Beaver Bay, Mon, May 23, 9:52 - 10:46 pm, 2006
O mundo criado por Silicon Valley é efémero, e Silicon Valley corre o risco do efeito de boomerang.

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