A globalização está na ordem do dia, e qualquer que seja o motivo, económico, político, cultural...suscita múltiplas discussões e opiniões.
Vem a globalização a propósito da Bienal de Veneza. Robert Storr, o primeiro americano a comissariar a Bienal, é criticado pelo país anfitrião, a Itália. Para os críticos, a presença italiana é diminuta, só 10 artistas em Giardini, e seguem-se os lamentos pelos custos ultrapassados, “Storr gastou mais do que podia, mas claro, como os americanos têm o costume de gastar capital privado...é o problema de se convidar comissários estrangeiros, não conhecem a situação do país e depois gastam que nem uns loucos, referem os mais rancorosos, e continuam até o Papa, já faz tempo que não é italiano...”.
Por cá a indignação também é grande, se os italianos se queixam de só ter dez artistas, na escolha de Storr, não há rostos da arte portuguesa, Ângela Ferreira é representante nacional não escolha de Storr. Nos jornais, a crítica é unânime em dizer que a ausência não está na falta de qualidade dos artistas portugueses, mas de uma política eficaz que dê visibilidade aos artistas, e para muitos, Portugal também já não é um país suficientemente exótico para aí estar representado, como a Turquia e África que têm este ano um pavilhão.
Numa entrevista, a um jornal e à pergunta: “não lhe parece contraditório, quando se fala tanto em mundialização, o número de pavilhões nacionais aumentar na Bienal?” Storr responde “esta “cultura nacional” deixa-me perplexo” e continua “ cada vez mais os artistas trabalham num quadro explicitamente internacional, o que não quer dizer que a arte se tenha homogeneizado a nivel mundial,...agora, escolher os artistas em função de uma representação nacional, não é a forma que eu vejo de abordar a questão...”. “Toda a minha exposição de Veneza tem a ver com a questão que coloco no título, “Think with the senses, feel with the mind”.
Se ao nível da arte, a “cultura nacional” ainda deixa perplexa muita gente, ao nível dos mercados financeiros, “cultura nacional” já não existe há muito e a globalização é uma evidência, basta lembrar o célebre caso do hedge-fund LTCM (Long Term Capital Management). Myron Scholes e Robert Merton, que no ano anterior tinham ganho o Nobel da Economia, geriam o fundo americano em gabinetes com rasgadas janelas que davam para um belíssimo parque, para ajudar a reflexão. Com rentabilidades anuais na ordem dos 40%, o fundo tornou-se num dos maiores hedge-fund da América. Como é permitido aos hedge-funds, Scholes e Merton, utilizavam a alavacagem. O capital alavancado variava entre 20 a 40 vezes, e o risco era elevado para os montantes em causa. Aplicações em obrigações de taxa fixa, levaram em 1998, o LTCM a perder mas de metade do seu valor. Alan Greenspan, na altura presidente da Reserva Federal Americana, percebe o risco, tratava-se de um valor que ultrapassava o sistema financeiro americano, e o credor principal eram os bancos de Wall Street. Greenspan pediu ajuda aos bancos estrangeiros para evitar o colapso financeiro, como ele referiu “LTCM could have posed “severe risk” to global financial markets”.
Um ciclo vicioso estava criado, atribuia-se 10% das percas aos bancos russos, por incumprimento do pagamento da sua dívida pública...No ano seguinte, o Deustche Bank comprava o americano Bankers Trust, caso inédito na América, mas o Deustche ajudara a financiar a crise do LTCM, a globalização já há muito enraízada, torna-se como uma bola de neve, cada vez maior...
Quem trabalha nos mercados financeiros, sabe que a globalização não são só benefícios, o risco subjacente é elevado e nunca se sabe bem as consequências. Para os artistas e comissários portugueses o problema da divulgação dos nossos artistas não reside na falta de qualidade para competir, o problema, é que com a globalização, o mundo da arte tornou-se cada vez mais abrangente, e a representatividade geográfica é cada vez mais alargada. Torna-se humanamente impossível a um comissário percorrer e visualizar todos os trabalhos à escala mundial...
Por cá os economistas falam dos benefícios da globalização como factor de pressão no aumento da competitividade. Competitividade significa qualidade, e claro que todos concordamos. Mas os economistas viram as costas para o mar, para o oceano Atlântico que percorre toda a nossa costa, e só têm olhos para a Europa, para eles é lá que devemos competir e ganhar, e apontam algumas experiências de sucesso...quem conhece a realidade sabe a absurda burocracia do nosso país...
Allan Sekula, é um californiano que olha para o mar como centro da economia globalizada, e na década de 1980, começa “Fish Story” um trabalho que o ocupará vários anos, “the topic was the sea as the forgotten space of modernity” afirma Sekula numa recente entrevista. Los Angeles, San Diego, Hong Kong, Gdansk, Roterdão, Vigo, Vera Cruz, foram alguns dos portos que fotografou. Como ele diz “ No one would describe Los Angeles as a maritime city. A port with a present and an optimistic future, but oddly indifferent to its own past”. Na linha dos seus contemporâneos, de Victor Burgin a Jeff Wall, inova a fotografia documental, fotografias, textos e slides, fazem parte do trabalho. Sekula não olha só para o presente, interessa-lhe e investiga o passado da história marítima. O passado é fonte de um vasto arquivo de representações, desde as marinhas de J.M:W. Turner, no século XVII, ao filme “Battleship Potemkin” de Sergei Eisenstein. Mas acompanha o presente a bordo de um navio de mercadorias, de New Jersey a Roterdão, onde atravessa o Atlântico. A invenção dos contentores, na década de 1950, e o transporte em navios foi o que para Sekula “that makes the global system of manufacture possible”. Para ele, a internacionalização das mercadorias que contribuiram por sua vez para a homogenização e globalização dos hábitos de consumo, fez-se através do mar e é nas cidades portuárias, que a economia globalizada é mais visível.
Se o projecto “Fish Story” terminou em 1995, em 99 será “Freeway to China”.
E em 2001 será Tsukiji, e “then the movie began...views of famous scenic spots like the imperial palace...flickered past.”
No texto que anuncia a exposição lemos o seguinte: “Desempenhando actividade como fotógrafo, teórico, historiador de fotografia e escritor, o trabalho de Allan Sekula incide sobre as consequências das mudanças económicas resultantes da globalização, questionando ainda a função da fotografia documental dos “media”, na arte e na sociedade. Nos trabalhos (fotografias a cores associadas a texto), o artista dedica-se à temática da economia, com o objectivo de oferecer uma alternativa à cultura fotográfica habitualmente veiculada pelos museus e galerias.”
No dia 13 de Novembro de 2002 é a catástrofe no mar da Galiza, o petroleiro Prestige afundava a poucos metros da costa. Pela proximidade ainda nos lembramos do Prestige. Sekula regressa ao porto de Vigo para fotografar a tragédia.
Olhando para as fotografias de Sekula e dos vários jornalistas, não notamos diferenças. O problema é comum, denunciar a falta de segurança marítima. As fotografias de Sekula circulam pelo mundo, as dos jornalistas ficaram pela Galiza.
Por fim, na Documenta 12, que abriu no passado dia 16 de Junho em Kassel, é a vez de “Shipwreck and Workers” trabalho de 2005/07.
1 comentário:
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