segunda-feira, setembro 10, 2007

9/11

Em Lisboa eram quase duas da tarde, em Nova Iorque eram quase 9 am, a bolsa de Nova Iorque abriria daí a meia hora. Em frente à bloomberg, aguardava a abertura, para um dia que me parecia prometedor. Em rodapé uma linha em vermelho, utilizada para as notícias importantes, despertou-me a atenção, dizia qualquer coisa como, um avião acaba de se despenhar numa das torres do World Trade Center. Automaticamente liguei a televisão e a CNN já filmava o desastre. Tudo isto, julgo, um ou dois minutos depois do acidente. Os jornalistas da CNN comentavam incrédulos como era possível: o céu em Nova Iorque estava limpo e aparentemente nada justificava tal erro... Passados 18 minutos, um outro avião entrava na segunda torre. Um ataque terrorista _ era agora a certeza.
A CNN encontrava-se diante do World Trade Center para iniciar umas filmagens, acabaram a filmar o acontecimento na íntegra. O mercado não abriu, e fiquei estupefacta a olhar para as filmagens que passavam na televisão. O centro de Nova Iorque, o coração da América, acabava de ser alvo de um terrível ataque terrorista, o primeiro em casa, na sua história.

Durante várias semanas, o mundo inteiro viu as filmagens do ataque às torres gémeas de vídeos amadores, e Manhattan tornou-se no lugar mais retratado.
Joel Meyerowitz, fotógrafo nova iorquino pertencente à geração de 60, vive e trabalha em Nova Iorque. Da janela do seu loft, na 19 avenida via as torres gémeas. Fotografou-as vezes sem conta, a última a 5 de Setembro, antes de partir para a sua casa de férias em Cape Cod.
Joel Meyerowitz, do livro Aftermath, Jan 1st 1983

Preparava aí, no seu estúdio uma exposição sobre Manhattan. Quis Manhattan que nesse dia fatídico Meyerowitz estivesse em Cape Code. Meyerowitz fotografou o antes e o depois,
Joel Meyerowitz, do livro Aftermath

esteve ausente para fotografar o durante.
Quando pôde regressar à sua casa na cidade o mundo mudara, como ele mudara há quarenta anos da fotografia espontânea a preto e branco para a fotografia estática a cores. Meyerowitz mudara como mudara o fotojornalismo. Durante décadas o “momento decisivo” ligou a fotografia à memória colectiva. A guerra do Vietname foi a última a ser fotografada, e hoje a memória dessa guerra reconstrói-se com meia dúzia de fotografias. A televisão invadira o espaço do fotojornalismo com o seu tempo real e acabava com o “momento decisivo”. Hoje são os vídeos amadores que invadem o espaço televisivo, ao registarem, em directo, todos os momentos num contínuo. As fotografias que vemos nos jornais são na sua maioria fotogramas de filmes em vídeo. Aos fotógrafos resta o depois, perderam a relação imediata com os acontecimentos, e deambulam pelos lugares onde aconteceram os momentos decisivos. Críticos, como David Campany, chamam a este registo fotográfico do depois, “fotografia tardia”. Mas a fotografia continua a reclamar para si a memória colectiva, monopólio que já lhe pertenceu. O livro "Aftermath (World Trade Center Archive)" de Meyerowitz é um exemplo.
Regressado à cidade, Meyerowitz foi ao recinto, ao ground zero para o fotografar, não o deixaram, como refere no livro “No photographs, buddy, this is a crime scene”afirmação à qual argumenta, “Listen, this is a public space”. Não se conforma, sente que tem de fazer um arquivo de tudo o que se passava no ground zero, um testemunho para deixar às gerações seguintes. “It could be similar in approach to the work of the FSA, making visible for the rest of the country the consequences of a national disaster”

Consegue convencer o director do Museum of the City of New York, e obtém acesso exclusivo. No dia 23 de Setembro com a sua Deardoff, uma câmara de grande formato com mais de sessenta anos de idade, pesando mais de vinte quilos, Meyerowitz, vai sózinho para o meio dos escombros e gruas, onde ainda se sente todo o inferno da tragédia, só sairá passados nove meses, em Junho de 2002.

Campany, num comentário ao programa televisivo do trabalho de Meyerowitz refere, “ (Meyerowitz) parecia insinuar que a fotografia, e não a televisão, era o meio mais indicado para fazer a história oficial”.

Jorge Calado, num artigo dedicado ao livro “Aftermath” que a Phaidon acabara de editar (2006), refere, “Sinto (ainda) demasiado o acontecimento para poder apreciar a obra do ponto de vista fotográfico”.

Olhemos para algumas dessas imagens, para o testemunho que Meyerowitz nos quis deixar, um registo épico de retratos e detalhes dos trabalhos de escavação, onde em todas elas domina uma luz que as torna atractivas:













Naquela noite 11 milhões de dólares foram recuperados dos cofres dum banco.

O arquivo das milhares de fotografias que Meyerowitz tirou no ground zero são hoje pertença do museu que o apoiou. Para além do livro, as suas fotografias foram expostas na cidade e circularam posteriormente pelo mundo.

Aqui numa entrevista em 2008, Meyerowitz volta ao ground zero.

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