sábado, novembro 01, 2008

"El Dia de los Muertos"

O dia de Todos os Santos e o dia de Fieis Defuntos que se comemora respectivamente no primeiro e segundo dia do mês de Novembro são as celebrações mais espalhadas e queridas do México.


Manuel Alvarez Bravo, Señal, Teotihuacán, 1956

No dia 2 de Novembro de 1926, o fotógrafo Edward Weston , nas vésperas de deixar definitivamente o México escreve o seguinte no seu diário: “ November 2, …The puestos are open for “El Dia de los Muertos”. For the last time we walked the alameda. Kewpile dolls, tin toys, Japanese screens, horrible abortions from Tlaquepaque, - such rubbish was offered and sold from two thirds of the puestos. Yet it was colourful despite the corruption of taste...the indifferent familiarity of the Mexican to death – the macabre viewpoint is indicated in the puestos on this day of dead. “Death for sale” is the vendor’s cry – Death from every realistic and fantastic angle is sought and sold. Great candy skulls, tin trolley car hearses, tombstones, puppet skeletons who fiddle and dance, gruesome death masks – while a jolly crowd banters and buys”.
Se as nuvens e as pulquerias mexicanas inspiraram o californiano Weston, o folclore do “El Dia de los Muertos”, são, como revela nesta sua crítica mordaz, incompreensíveis.
No México, o culto dos mortos e todas as festividades que lhes estão associadas resultam de paralelismos e convergências de várias tradições culturais. Das primitivas culturas de Tlatilco, Cuicuilco e Tiapacoya, que se desenvolveram cerca de 1800 a.C., donde provêm os mais antigos testemunhos de rituais funerários,


Manuel Alvarez Bravo, Coatlicue, 1987

ao cristianismo trazido pelos colonizadores espanhóis, resultou uma sobreposição de conceitos e práticas destas várias culturas em relação à dualidade vida – morte.

Os mistérios desta dualidade, incompreensíveis para os estrangeiros, são o que sustenta a particular forma de ver, sentir e viver a morte dos mexicanos.


Manuel Alvarez Bravo, Caballito de Quito, 1984

Para o mexicano Manuel Alvarez Bravo, a morte, companheira inseparável da vida, serve como ponto de partida para a sua existência, e não se coíbe de fotografar as caveiras que embelezam os altares nestes dias, mas que Weston vê tão macabras.


Manuel Alvarez Bravo, La fábrica de calaveras, 1933


Manuel Alvarez Bravo, Día de todos muertos, 1933

Quando uma pessoa está sempre atenta à realidade encontra nela tudo o que é fantástico” diz Alvarez Bravo, e em Parábola óptica, a sua fotografia mais conhecida, os reflexos dos olhos na montra continuam a causar uma intrigante surpresa, como causou ao seu autor quando a imprimiu pela primeira vez em 1931.


Manuel Alvarez Bravo, Parábola óptica, 1931

No mundo real, na vitrina de um oculista, que curiosamente tem o nome de SPIRITO, Alvarez Bravo encontrou o fantástico - uma imagem com um poder que o fez imprimir também em reverso tal como os mistérios da dualidade vida - morte.


Manuel Alvarez Bravo, Parábola óptica, 1931

Analogias semelhantes desta dualidade encontramos em Bergman e Freud, em que olhos, sob forma onirica, nos espiam o interior, e são o prenúncio da morte em vida.

Em “Morangos Silvestres”, 1957, os olhos, por debaixo do relógio sem ponteiros,


Fotograma do filme "Morangos Silvestres" de Ingmar Bergman, 1957

que Victor Sjöström vê em sonho, são o prenúncio da sua morte que está próxima.

Em “Interpretação dos sonhos”, 1905, Freud relata um sonho que teve no dia seguinte ao enterro do seu pai : no espelho do barbeiro onde ia regularmente viu reflectido em caracteres tipográficos bem visíveis: “É favor fechar os olhos”, enunciado este que trazia outra possibilidade: “É favor fechar um só olho, ou então abrir os dois”.

Nestes primeiros dias de Novembro, os mexicanos, numa dimensão de atemporalidade, contrariando as teorias do macabro, do horripilante, celebram a morte na tentativa de anular o tempo, crendo na continuidade da vida para além da morte.


Manuel Alvarez Bravo, A la mañana siguiente, 1945

A vida e a morte sempre juntas…

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