O fracasso eleitoral, (28/09) da União Social Cristã na Baviera, - os parceiros de coligação do Partido Democrata Cristão de Ângela Merkel, fez-me lembrar a Índia.
Teresa Perdigão, Índia, 2007
A Baviera, uma das regiões mais ricas da Alemanha, quer em matéria económica, inovação e educação, penalizou o partido no poder ao perder a maioria absoluta que dominava desde 1962. Porém, não foi o partido adversário -Partido Social Democrata, que a aproveitou mas pequenas coligações regionais, que agora terão assento no Parlamento Regional. Numa Europa em que União é palavra-chave, a Baviera elege pela primeira vez, uma coligação regional, “eleitores livres”, para o seu Parlamento. Perguntará o leitor, o que tem a Baviera a ver com a exótica Índia?
No livro “O Mundo pós-americano”, do indiano Fareed Zakaria, e editado há dias pela Gradiva, lê-se o seguinte: “Pode-se perceber que a Índia é uma terra estranha não pela observação dos encantadores de serpentes, mas pela dos resultados das suas eleições: em que outro país é que um crescimento económico vibrante tornaria um político impopular? Em 2004, a coligação no poder, liderada pelo PBJ, (Partido Bharatiya Janata) foi a eleições com o vento económico pela popa – o país estava a crescer 9% ao ano. Mas o PBJ perdeu as eleições”.
Alguns explicam, como Thomas Friedman, os resultados desta eleição com a inveja e zanga dos milhões de habitantes da Índia rural – “é como se fosse um gigante enraivecido”, que vê vedado o estilo de vida das pessoas na cidade. Para Zakaria esta explicação não é suficiente, porque “mesmo quando há preocupações legítimas a respeito de desigualdades e de distribuição de riqueza, há sempre uma relação entre crescimento económico robusto e popularidade do governo”. Para o autor só a diversidade da Índia, país com 17 línguas e 22 mil dialectos, é que explica tal resultado, cada região, tal como agora a Baviera, luta pelos seus próprios interesses, independentemente das políticas do governo serem boas ou más. Nos anos 70, Indira Gandhi, tentou dirigir um governo de forma autoritária e centralizada – não só não conseguiu como provocou revoltas violentas em seis regiões. A diversidade tem muitas vantagens não só aumenta a variedade e energia da Índia como impede o país de sucumbir à ditadura.
Autoridade e rigor não se coadunam com a liberdade caótica da democracia indiana e por isso sempre me intrigou, como Chandigarh, a cidade que Le Corbusier dividiu tão organizadamente por sectores, teve êxito no país de “encantador de serpentes” - Brasília, que serve de comparação porque também inspirada na mesma noção de capital ideal, não teve esse sucesso.
Mas as fotografias de Lucien Hervé, o fotógrafo de Corbusier, e Robert Polidori num trabalho recente ajudam a entender
Lucien Hervé, Chandigarh, Secritariat, Índia, 1961
Robert Polidori, Chandigarh, Punjab, Índia, do livro Metropolis
– no meio das quadriculas e rigor geométrico, a liberdade de movimentos.
Nos últimos quinze anos, a Índia e a China, foram os dois países, a nível mundial que mais cresceram, mas a forma como cada um cresceu é de um contraste abissal – dois sistemas políticos, autocracia e democracia, fazem toda a diferença. As infra-estruturas da Índia não se comparam às auto-estradas de oito faixas e às cidades e aeroportos reluzentes da China. O governo de um só partido consegue planear e executar grandes infra-estruturas com uma eficiência sem igual, mesmo que isso desloque milhões de pessoas indefesas. A exuberância das cidades chinesas, com os seus mega projectos construídos em meses, na maioria por multinacionais, impressionam turistas, investidores e fotógrafos. Em contraste na Índia as cidades são confusas, caóticas
Sandra Rocha da Kameraphoto, Bombaim, editada na revista "Volta ao Mundo", Julho 2008
e sem urbanização controlada, mas se alguém quer ir para Bombaim, Nova Deli, Bangalore ou qualquer outra cidade à procura de emprego é livre de o fazer – aos cidadãos chineses o governo exige prova de emprego antes de a habitarem. Com os Jogos Olímpicos o Ocidente testemunhou o novo estilo de vida chinês. Orgulhosos do país, os chineses revelam não estar preocupados se a sua liberdade é condicionada - julgo que a longo prazo os chineses perceberão a diferença.
Na Índia as reformas económicas planeadas há mais de uma década pelo actual primeiro-ministro, Manmohan Singh, demoraram algum tempo até dinamizarem o sector privado, a coluna vertebral do crescimento indiano. Empresas como a Infosys, Tata, Reliance Industries, figuram na revista Forbes, como das maiores no mundo e pertencem a indianos que as gerem eficientemente,
Robert Polidori, Reliance Industries, Jamnagar, Índia, 2008
Robert Polidori, Reliance Industries, Jamnagar, Índia, 2008
Robert Polidori, Reliance Industries, Jamnagar, Índia, 2008
Robert Polidori, Reliance Industries, Jamnagar, Índia, 2008
muito longe das linhas de montagem instaladas pelas multinacionais na China, e que deixam no país só 3% da mais valia total.
A Reliance Industries, do indiano Mukesh Ambani, varia as suas actividades entre refinaria de petróleo, petroquímicos, produção de gás, serviços financeiros e telemóveis. A empresa promete tornar a Índia auto-suficiente em energia nos próximos anos e num projecto arrojado, procura suprimir as diferenças entre os preços do produtor e consumidor em mais de metade.
Nehru não se enganou quando chamou a Bangalore “the city os India’s future”. Se as estradas esburacadas, onde reinam as vacas sagradas,
Jorge Monedero, Bangalore Street Scene, Índia, 2008
Jorge Monedero, Bangalore Street Scene, Índia, 2008
não permitem exportar bens volumosos, software e serviços preferem as estradas de banda larga e rede de fibra óptica de forma a concorrer em tempo real com as outras economias mundiais, as infra-estruturas da Índia são as auto-estradas da Internet.
Bangalore, a Silicon Valley da Índia, frustrou os analistas que viram o fim da globalização no estoiro, em 2001, das empresas de dot-com. A ironia foi o benefício que a Índia retirou desse estoiro, explorando praticamente a custo zero, o cabo de fibra óptica que as empresas de Silicon Valley instalaram. Ao regressarem ao país, (2001), os indianos não cruzaram os braços, empreendedores, tornaram Bangalore na cidade tecnológica e de serviços do século XXI, a que concentra no mundo mais engenheiros informáticos.
O peso da história está em todo o lado e no nosso imaginário, a Índia perdura como um país “encantador de serpentes”. Um Ocidental fotografa a Índia naquilo que vê diferente da sua experiência e inconscientemente procura as imagens que fizeram o país e que guarda em memória - a veneração do sagrado,
Fredric Roberts, Índia, 2004
as cores exóticas,
Fredric Roberts, Índia, 2004
Jorge Monedero, Bangalore, Índia, 2008
o atraso,
Fredric Roberts, Índia, 2004
Teresa Perdigão, Índia, 2007
a pobreza extrema.
Teresa Perdigão, Índia, 2007
Por vezes as memórias deveriam ser apagadas e o fotógrafo deveria viajar como os fotógrafos vitorianos nos primórdios da fotografia
Samuel Bourne, Bajoura, Índia, 1866
Samuel Bourne, Deig, Índia, 1865
- livres de imagens mas em busca da verdadeira descoberta, porque embora devagar a Índia movimenta-se.
Mas a verdadeira ironia está neste provérbio chinês: “A ordem movimenta-se devagar, mas com segurança. A desordem vai sempre apressada”.
segunda-feira, outubro 06, 2008
Na Índia
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No Mundo
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