Em 1928 ou 29, não se sabe bem ao certo, Walker Evans em Coney Island, fotografava a místula de sentimentos - alegria e terror - da gente que procurava no Luna Park de Nova Iorque momentos de fortes emoções.
Walker Evans, Coney Island, 1928-29
A 29 de Outubro de 1929, a sexta-feira negra que ainda hoje ninguém esqueceu, um “big bang” em Manhattan superava as emoções de Coney Island – o colapso da Bolsa desse dia iria mudar o destino de muitos homens. Era a Grande Depressão e para muitos o fim do capitalismo parecia não tardar.
Não é pois de estranhar que hoje se compare a actual crise financeira com a Grande Depressão dos anos 30. Saciada a liquidez bancária, a recessão económica é agora o centro das preocupações, e novamente, tal como a montanha russa de Coney Island, as descidas acentuadas das Bolsas fazem-se sentir mais uma vez. A consequência imediata, e como aconteceu nos anos 30, o número crescente, divulgado semanalmente, de milhares de pessoas que aumentam a taxa de desemprego.
Mas uma desgraça, como diz o povo, nunca vem só, e se em 1929, o desabar de Wall Street arrastou os bancos e as empresas para a falência, no Midwest, no celeiro da América, a chuva deixou de cair. “Na região cinzenta de Oklahoma…as nuvens apareceram e fugiram, e durante algum tempo, não voltaram a surgir…Chegou Junho e o sol queimava mais incisivamente,...o céu estava mais pálido, e, de dia para dia, a terra perdia a cor…o vento agora tornava-se mais rijo, soprando sobre a terra…a poeira mais fina não voltou a fixar-se na terra, desaparecendo no céu enegrecido”, John Steinbeck em “As vinhas da ira”, 1939. Se Steinbeck nos descreve a transformação do Oklahoma em pó, o fotógrafo, Arthur Rothstein, a trabalhar para a FSA, dá-nos em imagem as terríveis tempestades de areia, cujo pó, lhe provocou lesões permanentes no seu olho direito.
Arthur Rothstein, Fleeing a Dust Storm, Oklahoma, 1936
Curiosamente em 1930, um edifício de cento e dois andares – o Empire State Building, era construído não muito longe do local do “big bang”. A 1 de Maio de 1931, o então presidente Herbert Hoover, carregando num simples botão em Washington, D.C, fazia acender as luzes feéricas do edifício novaiorquino. O fotógrafo Lewis Hine acompanhou a construção, correndo os mesmos riscos dos milhares de trabalhadores da obra, que empoleirados na estrutura, a centenas de metros do chão, faziam equilibrismo sem rede.
Lewis Hine, Empire State Building,1931
Com a Depressão instalada, num país onde a miséria se alastrava,
Walker Evans, Arkansas, 1937
a maior parte dos andares permaneceram vazios, e rapidamente o edifício tomou a alcunha de Empty State Building. Só nos anos cinquenta é que o edifício se tornou rentável – e agora quem quiser compare esta obra com as megalomanias portuguesas.
No Outono de 1932, Franklin Delano Roosevelt, ganhava as eleições. A sua política do “New Deal” visava ajudar, regulamentar e reformar os vários grupos produtivos e económicos da nação. Ninguém foi esquecido, nem mesmo os artistas, que através da agência federal “Public Works of Art Project” lhes deu trabalho, ao encomendar grandes murais. Numa carta, 4/20/1933, a Hanns Skolle, Walker Evans escreve o seguinte: “Ben Shahn, (pintor que se tornará um dos melhores fotógrafos da FSA), is working with Rivera on a mural in Radio City, and that is exciting. I go up often and watch the procedure”.
Walker Evans, New York City, Diego Rivera Murals, 1933
No que respeita à fotografia, a agência “Resettlement Administration” (RA), criada em 1935, era dirigida por um professor de Economia, Rexford Tugwell. O seu fim – ajudar os agricultores e lavradores pobres. Simultaneamente Tugwell criou uma Secção Histórica, e escolheu Roy Stryker, um colega e também professor de Economia na Universidade de Colômbia, para a dirigir. Em 1937, esta Secção passou para o Ministério da Agricultura, e tomou o nome de “Farm Security Administration”, vulgo FSA, que se extinguiu em 1943. Através da fotografia, a FSA, tinha como missão, apresentar a América aos americanos,
Russell Lee, caixa de correio dum rendeiro de Oklahoma, Junho 1936
e conseguir que o Senado aprovasse as medidas urgentes para acudir aos mais necessitados. Arthur Rothstein, anos mais tarde recorda-se assim: “a tarefa era documentar os problemas da Depressão de modo a justificar o pacote legislativo do “New Deal” criado para aliviar esses mesmos problemas”.
O recente colapso de Wall Street, revela como hoje tudo mudou. Para salvar, com o uso dos recursos dos contribuintes, o Banco de Investimento Bear Stearns e o gigante AIG, os membros do Congresso foram simplesmente informados desta decisão de Henry Paulson, Secretário de Estado do Tesouro, e de Ben Bernanke Presidente da Reserva Federal.
Mas será que os políticos mudaram?
Em 1936, Rothstein fotografava, na terra seca e enrugada do South Dakota, uma caveira de um bezerro.
Arthur Rothstein, Crânio, Badlands, Pennington County, South Dakota, Maio, 1936
O fotógrafo fez várias exposições, e numa, chegou a arrastar a caveira dois a três metros para conseguir um fundo mais dramático. A imprensa logo soube e não tardou a denunciar que a imagem era uma aldrabice pegada, acusando o fotógrafo de andar com o crânio do bezerro de um lado para o outro. A polémica teve repercussões nacionais - 1936 era ano de eleições e tudo tinha conotações políticas, muitos queriam afastar Roosevelt da presidência. Poucos olharam para o sentido documental da fotografia - o gado que morria numa nação que sofria uma seca terrível.
O ‘corpus’ da FSA, um trabalho documental ímpar na história da fotografia está disponível neste site da Biblioteca do Congresso, onde estão reunidos 170 000 negativos e 70 000 imagens.
Stryker orgulhava-se de todo este trabalho documental não ter uma única imagem de Wall Street. Há dias, o fotógrafo da Magnum, Gilles Peress, disponibilizou na Internet o seu retrato da crise actual na América. As fotografias, que compõe em vídeo, mostram praticamente apenas Wall Street – o exemplo actual do fotojornalismo das notícias.
quarta-feira, outubro 22, 2008
A Grande Depressão dos anos 30
Etiquetas:
No Mundo
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2 comentários:
Queria apenas felicitá-la pelo valor dos conteúdos que vem publicando. Já há algum tempo que a "acompanho" (via RSS), mas achei por bem deixar uma palavra de apreço. Não havendo email de contacto, teve de ser desta forma...
Parabéns! ;)
Mário agradeço o seu comentário e já agora ainda bem que o fez porque me permitiu entrar no seu blog que não conhecia. Li o seu Manifesto. Não posso concordar mais quando diz que as imagens apresentadas no monitor tem as suas limitações, comparando com a possibilidade de as ver em papel. Foi também com gosto que olhei para as suas excelentes fotografias apresentadas no Porjecto Noventa e três, os meus parabéns.
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