sexta-feira, julho 20, 2007

Ed van der Elsken

Em Roma falei de New York de William Klein, mas era de Roma que o post tratava e as fotografias de New York de Klein não apareceram.
No filme “No Direction Home” sobre a vida de Bob Dylan, Martin Scorsese, junta os versos de Jack Kerouac com as fotografias de New York de William Klein,
No Direction Home, Bob Dylan, Martin Scorsese, fotografias de William Klein e texto de Kerouac

depois vem Dylan “...nasci muito longe de onde deveria estar”. Hibbings, no Minesota, uma cidade rural, igual a tantas outras cidades dos anos 40 ou 50. Hibbings é a cidade onde nasceu Dylan muito longe de onde deveria ter nascido, Nova Iorque, “...começei a ouvir rádio, começei a fartar-me de estar ali. Não acontecia nada de especial em Hibbings ...ambicionava procurar e encontrar o meu lar nalgum lado”. O lar foi Nova Iorque, para onde se mudou e onde viveu a atmosfera da beat generation, “...sentia-me naquela atmosfera de tudo o que Kerouac dizia, acerca do mundo estar completamente louco, e as únicas pessoas que ele achava interessantes eram os loucos, aqueles que eram loucos a viver, desejosos de tudo em simultâneo, aqueles que nunca bocejam, todos esses loucos. Sentia que pertencia a esse grupo de pessoas...”. É a Nova Iorque do pós-guerra, é a Nova Iorque da guerra fria que teme pela bomba atómica.

A milhas de distância, em Paris, vivia-se o existencialismo em Saint Germain des Prés, o bairro onde se juntava toda uma geração, “aqueles que eram loucos a viver, desejosos de tudo em simultâneo, aqueles que nunca bocejam, todos esses loucos.” Agora é Ed van der Elsken que deixa Amesterdão, onde nada acontecia e procura o seu lar em Paris, em Saint Germain des Prés, não muito longe de onde nasceu.
São muitas as semelhanças entre Van der Elsken e Klein, ambos fotografam sem preconceitos a vida desses loucos que viviam como se o mundo terminasse no dia seguinte. De 1950 a 54, ambos vivem em Paris. Em 1954, Klein regressa a Nova Iorque, Van der Elsken regressa a Amesterdão. Ambos publicam o primeiro livro em 1956, “Een Liefdesgeschiedenis in Saint Germain des Prés”, (Love on the Left Bank) de Van der Elsken
e “Life is good and good for you in New York, Trance witness revels”
é o livro de Klein, “beat title”, dirá , pois Nova Iorque é exactamente ao contrário.
Van der Elsken é encorajado a fazer o livro por Edward Steichen, que andava pela Europa à procura de imagens para o seu “Family of Man” (1955), Alexander Liberman da Vogue, será o encorajador de Klein. Steichen é o responsável pela exposição seminal do fotojornalismo mundial, “The Family of Man” Liberman é um dos melhores no mundo da moda, mundos tão diferentes que encorajam um outro mundo, o sub-mundo de Saint Germain des Prés e do Harlem. Paris não gostou do livro de Van der Elsken, foi editado pela De Bezige Bij em Amesterdão, Nova Iorque não gostou do livro de Klein, foi editado pela Editions du Seuil em Paris. Ambos gostam de viajar, e ambos foram ao Japão, ambos editaram um livro sobre o Japão, e ambos influênciaram a nova geração japonesa.
Com Van der Elsken entramos no mundo de Saint Germain des Prés através da namorada australiana, Vali Meyers, que no livro se chama Ann, “the girl with orange hair who danced like a negress”,
Ed van der Elsken, do livro Love on the Left Bank, 1956

conhecemos os amigos e o sub-mundo do hashish e do opium, da noite nos cafés e nightclubs, das sombras, do sexo, da violência...



Todas as fotografias são de Ed van der Elsken, do livro Love on the Left Bank, 1956

Dois anos antes do livro o Picture Post publicou as fotografias e a revista alertava os leitores: “this is not a film.This is a real-life story about people who do EXIST”. A paginação de Jurriaan Schrofer, é cinemática, é a serialização e o confronto dos grandes/pequenos planos.
“Love on the Left Bank” é o diário íntimo de Van der Elsken transformado num filme de ficção. New York de Klein também é cinemático, mas será Robert Frank um Suiço, que emigra para Nova Iorque, que conhece a Europa e que vê as diferenças que diz sem se referir ao livro de Klein: “os filmes franceses faziam-nos penetrar num universo poético, mas o cinema americano era a verdade...Nova Iorque é uma ilha, uma coisa monstruosa, que junta milhões de pessoas que não têm nada a ver umas com as outras. Muda continuamente, mexe, ninguém pode prever de que maneira, nem controlar tudo aquilo”não é um comentário ao New York de Klein mas poderia bem sê-lo, retratar Nova Iorque, pela descrição de Frank, é filmar.
Nesse ano de 1956, quando Van der Elsken e Klein editam os livros, Frank ainda andava pelas estradas da América a fotografar o que viria a ser o livro “Les Américains”, 1958, com textos, entre outros, de Simone Beauvoir, e “The Americans” , 1959, com o texto de Jack Kerouac, é o existencialismo francês na edição francesa, é a geração beat na edição americana.
Viver em Nova Iorque tirou a Frank a obsessão pela fotografia única, singular, e procura outra maneira de se exprimir, vêm então os filmes, dirá “ podes viver em Nova Iorque por quarenta anos, e continua a ser como num filme, são os arranha-céus, as escadas de incêndio...”. “Pull my Daisy”, 1959, será o primeiro, serão os filmes, e não a fotografia, que o ajudarão a atravessar a vida, as dificuldades, os dramas familiares. “Pull my Daisy”,
Robert Frank, fotograma de "Pull my Daisy", 1959

baseado no terceiro acto da comédia “The Beat Generation” de Kerouac, um guião que não serviu práticamente nada, é um filme autobiográfico, como autobiográfico é o livro de Van der Elsken “Love on the Left Bank”. O filme é sobre a sua vida, das pessoas mais próximas, dos seus amigos. Filmado em vários locais de Nova Iorque, sem recorrer a actores e cenários, são os amigos, Allen Ginsberg, Peter Orlovsky, Alice Neel, Larry Rivers...que representam, é feito de improviso e sem ensaios, e a espontaneidade é um dos efeitos visíveis.
Frank gosta de Scorsese, “gosto de Woody Allen pela sua inteligência, mas o que prefiro é o King of Comedy, de Scorsese, nunca tinha sido feita coisa tão cruel, tão real sobre a América” e também de Bob Dylan “é um fulano genial, que nunca fala”. Scorsese no filme sobre Bob Dylan utiliza com frequência fotografias, e não escolhe só New York de Klein, mas também Robert Frank.
No direction Home, Bob Dylan, Martin Scorsese

A crítica liga os três, Klein, Van der Elsken e Frank, pelos livros, mas porque não ligar Frank pelo filme “Pull my Daisy”, é o filme fotográfico junto dos livros cinematográficos.

Á geração beat, segue-se a geração do flower power, e Amesterdão na década de 1970 é a cidade ideal, pois a mais liberal no mundo. Van der Elsken, já não precisa de sair, Amesterdão já não o aborrece, e nesses anos, já a cores, fotografa os hippies, as raparigas em hot-pants,...nunca deixará de fotografar e filmar as pessoas.








Ed Van der Elsken, Roterdão, Amesterdão, 1967/1970

Roterdão, na Holanda, inaugurou à dias um Museu de Fotografia, Nederlands Fotomuseum. A exposição de abertura, “Dutch Eyes”, propõe uma retrospectiva de 150 anos de fotografia holandesa. “Jazz” de Ed van der Elsken é outra das exposições a ver. Há quinze dias uma crítica do jornal “Expresso” recomendava Ed van der Elsken, no Nederlands Fotomuseum, como uma boa alternativa aos quadros de Rembrandt e van Gogh.

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