É verdade, 99 Cents, que nem chega a 1 dólar, vale 2.535.468 euros, assim aconteceu no último leilão realizado pela Sotheby’s. O díptico 99 Cents de Andreas Gursky
99 Cents, Andreas Grusky, 1999
atingiu um novo recorde no mercado da fotografia e ultrapassou por pouco os $ 2.928.000 (equivalente a 2.500.000 euros), de The Pond - Moonlight de Edward Steichen (1879-1957) também leiloado pela Sotheby’s hà precisamente um ano.
The Pound - Moonlight, Edward Steichen, 1904
O mercado da fotografia é recente, não tem mais de 30 anos, e iniciou-se quando na década de setenta coleccionadores privados, (Hallmark, Gillman, Thomas Walter...) e institucionais, (Getty Museum de Los Angeles, o Metropolitan Museum of Art (Met) em Nova Iorque, National Gallery of Art em Washington...), começaram a comprar fotografia em leilões. Na altura o preço de qualquer fotografia oscilava entre poucas centenas de dólares. Nos últimos anos, o mercado da fotografia entrou na moda e os preços subiram vertiginosamente. Agora falamos em muitos milhares de dólares/euros e a fotografia passou a ser um activo apetecível para os investidores.
Mas olhemos para estas duas fotografias que bateram recordes de licitação.
The Pound – Moonlight (1904) inicia o século XX, 99 Cents (1999) finaliza-o. Quase um século as separa. Diferenças? Semelhanças?
Uns anos antes de The Pound – Moonlight, a Kodak revolucionava a fotografia. “Carregue no botão, que nós fazemos o resto” dizia o slogan, e tal aconteceu, toda a gente carregou no botão das novas máquinas e a fotografia banalizou-se. Mas os fotógrafos dos Foto Clubes que se diziam artistas, não gostaram.
O mercado da fotografia é recente, não tem mais de 30 anos, e iniciou-se quando na década de setenta coleccionadores privados, (Hallmark, Gillman, Thomas Walter...) e institucionais, (Getty Museum de Los Angeles, o Metropolitan Museum of Art (Met) em Nova Iorque, National Gallery of Art em Washington...), começaram a comprar fotografia em leilões. Na altura o preço de qualquer fotografia oscilava entre poucas centenas de dólares. Nos últimos anos, o mercado da fotografia entrou na moda e os preços subiram vertiginosamente. Agora falamos em muitos milhares de dólares/euros e a fotografia passou a ser um activo apetecível para os investidores.
Mas olhemos para estas duas fotografias que bateram recordes de licitação.
The Pound – Moonlight (1904) inicia o século XX, 99 Cents (1999) finaliza-o. Quase um século as separa. Diferenças? Semelhanças?
Uns anos antes de The Pound – Moonlight, a Kodak revolucionava a fotografia. “Carregue no botão, que nós fazemos o resto” dizia o slogan, e tal aconteceu, toda a gente carregou no botão das novas máquinas e a fotografia banalizou-se. Mas os fotógrafos dos Foto Clubes que se diziam artistas, não gostaram.
Lembraram-se então de confundir fotografia com pintura. Se as fotografias tivessem os mesmos valores da pintura já a podiam elevar a arte. A base de The Pound – Moonlight é um papel impregnado com sais de ferro e platina a que se Steichen adicionou camadas de gomas bicromatadas, método laborioso que exigia trabalho manual. A prova final era única, era impossível fazerem-se duas iguais, tal como as obras pictóricas que também eram únicas. Steichen era amigo de Alfred Stieglitz, e pertenciam ao Camera Club de Nova Iorque. O grupo utilizava truques, espalhavam óleo na lente das objectivas, utilizavam gaze... para tornarem a focagem mais difusa e assim aproximarem a fotografia da pintura, mas de uma pintura passada, porque à época a pintura emancipava-se do real e enveredava pela abstração. Steichen gostava das paisagens românticas com lagos e luares, e Stieglitz fazia auto retratos à moda de Rembrandt.
Self-Portrait, Alfred Stieglitz,1907
Os pictorialistas, como os chamaram, valorizavam o sentimento. Foi precisa a nova visão, pura e directa de Paul Strand e Alvin Langdon Coburn, para acabar com as emoções sentimentais.
White Fence, Paul Strand, 1916
The Octopus, Alvin L. Coburn, 1912, New York
Stieglitz e Steichen perceberam a modernidade que vinha a caminho, e deixaram as gomas bicromatadas. O que espantou mais no leilão, não foi o montante da licitação mas o tipo de fotografia, ainda hoje é considerada uma das fases piores da história fotográfica.
Mas ao contrário de The Pound – Moonlight, o diptico 99 Cents de Gursky, é valorizado pela escola que representa, a escola de Dusseldorf, hoje um valor seguro no mercado actual.
Para Gursky, na década de 1990, o mundo era grande, high-tech, acelerado, caro e global. Dos centímetros de The Pound –Moonlight, 41 x 51 cm, passamos para os metros de 99 Cents, 206 x 341 cm.
99 Cents, é uma cadeia de supermercados californiana, e representa a nossa sociedade de consumo, as compras nas grandes superfícies, iguais em todo o lado.
Se até finais de 1980 a obra de Gursky era interpretada na linha dos seus mestres, Bernd e Hilla Becher, na década seguinte as manipulações digitais, permitiram a Gursky uma construção fictícia, a fotografia já não é credível, para Gursky o documento tende para o imaginário e a ficção para a realidade.
Se os picturialistas imitavam a pintura romântica, Gursky prefere a pintura abstracta.
Rhein II (1999) causa-nos estranheza, como nos causa 99 Cents.
Mas ao contrário de The Pound – Moonlight, o diptico 99 Cents de Gursky, é valorizado pela escola que representa, a escola de Dusseldorf, hoje um valor seguro no mercado actual.
Para Gursky, na década de 1990, o mundo era grande, high-tech, acelerado, caro e global. Dos centímetros de The Pound –Moonlight, 41 x 51 cm, passamos para os metros de 99 Cents, 206 x 341 cm.
99 Cents, é uma cadeia de supermercados californiana, e representa a nossa sociedade de consumo, as compras nas grandes superfícies, iguais em todo o lado.
Se até finais de 1980 a obra de Gursky era interpretada na linha dos seus mestres, Bernd e Hilla Becher, na década seguinte as manipulações digitais, permitiram a Gursky uma construção fictícia, a fotografia já não é credível, para Gursky o documento tende para o imaginário e a ficção para a realidade.
Se os picturialistas imitavam a pintura romântica, Gursky prefere a pintura abstracta.
Rhein II (1999) causa-nos estranheza, como nos causa 99 Cents.
Rhein II, Andreas Gursky, 1999
99 Cents, Andreas Gursky, 1999
Ambas as composições são horizontais com linhas paralelas e em ambas, Gursky elimina a perspectiva fotográfica, a terceira dimensão, o ponto de fuga, e regressa-se à planaridade da pintura. Em 99 Cents, a frente como a retaguarda estão no mesmo plano, não há reduções com a distância.
Periodicamente a fotografia procura a pintura e nestes dois casos a fotografia iniciou e finalizou o século XX a imitá-la.
Periodicamente a fotografia procura a pintura e nestes dois casos a fotografia iniciou e finalizou o século XX a imitá-la.
4 comentários:
O mais engraçado é que pode ter sido Peter Henry Emerson o pai disto tudo (do pictorialismo) quando se revoltou contra as manipulações(!) feitas por Henry Peach Robinson, Rejlander e outros. O realismo inerente às imagens de Emerson é indiscutível, mas aquela opção por um foco central, e os cantos esbatidos, poderá ter dado o mote para Stieglitz, Steichen e acólitos.
É muito interessante a relação que faz entre a fotografia de Gursky, a pintura e o pictorialismo. Com a sua permissão, irei referi-la numa das minhas próximas aulas, com a devida referência ao seu nome e ao seu blogue, claro!
que belíssima aula!!
(compreendo perfeitamente o comentário de cmf)
1 comentário e 2 perguntas a partir de citações suas neste post:
1. «Se as fotografias tivessem os mesmos valores da pintura já a podiam elevar a arte»; tal como o cinema fez com a literatura :-) Mas, curiosamente, segundo as vanguardas, só quando fotografia se emancipa da pintura e cinema da literatura podem almejar a ser arte...
2. «O que espantou mais no leilão, não foi o montante da licitação mas o tipo de fotografia, ainda hoje é considerada uma das fases piores da história fotográfica». Mas por que é considerada como tal? Por ofender um suposto purismo da fotografia que se deve ater a um registo realista?
3. «Gursky elimina a perspectiva fotográfica, a terceira dimensão, o ponto de fuga, e regressa-se à planaridade da pintura». É líquido que na pintura não haja ponto de fuga e que ela seja plana?
Tome isto e só como pensamentos em voz alta, não se sinta obrigada a responder por favor...
é sempre um prazer lê-la.
Em primeiro lugar agradeço as referências de cmf (Emerson, Robinson..)pois o que pretendo essêncialmente com este blog é divulgar a história da fotografia e por isso é um prazer quando acrescentam algo importante.
Sem-se-ver,é um prazer também lhe responder. O pictorialismo (como uma das fases mais negras da história da fotografia).Achei importante referir isso e vou tentar explicar, quer através das diversas histórias da fotografia como de artigos sobre fotografia, muitos deles da decada de 1980, desprezaram a fase do pictorialismo fotográfico. Vou-lhe confessar que eu própria acabei por ser influênciada e também para mim durante muito tempo foi das fases mais desinteressantes da fotografia. Hoje já não penso o mesmo.
Em relação à outra questão da planaridade, é evidente que desde o Renascimento que a pintura passou a representar o ponto de fuga. Se quiser ler em Novembro de 2006 escrevi um post sobre isso, o post é A rapariga com o Brinco de Pérola. Neste caso do Gursky referia-me à pintura abstracta.
ah. okok.
e obg.
(para aligeirar, e por associação de ideias quanto à sua última frase: um post delicioso no blog Passeai Flores - um babyblog - na qual a mãe relata que a sua criancinha fez um desenho e lho foi mostrar com o comentário 'olha mãe fiz um desenho abstracto! 'então porque dizes que ele é abstracto?' 'porque não deixei nenhum bocadinho de papel à mostra' :D
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