sexta-feira, outubro 20, 2006

Fotografia Documental (II), no contexto do Doclisboa 2006

(Continuação do artigo de 16/10/2006)

Da guerra do Afeganistão encenada em Dead Troops Talk de Jeff Wall passemos à 1ª guerra do Golfo.
Todos nós em casa, frente aos nossos televisores, fomos surpreendidos pelas imagens que a CNN difundiu em directo dessa guerra. De tons esverdeados, mais pareciam imagens de jogos de uma guerra virtual. Mas se no início nos surpreendemo-nos, ao longo dos dias fomos-nos habituando a essas imagens captadas via satélite que invadiam os nossos ecrãs até fazerem parte do nosso quotidiano familiar.
Para a elite militar americana o impacto que as fotografias da guerra do Vietname causaram na opinião pública estavam ainda bem presentes. Evitando ao máximo o testemunho directo no Koweit, as instâncias militares americanas preferiram divulgar imagens que mais se assemelhavam a uma guerra cirúrgica.
Realidade ou ficção?
Thomas Ruff, na sua série Nacht de 92/93, algumas expostas na sua retrospectiva de 2003 em Serralves, é uma reflexão sobre as imagens divulgadas dessa guerra. Nos mesmos tons esverdeados cujo conteúdo é quase imperceptível, Ruff mostra-nos que o contacto com o real, o "ter estado lá" é agora impossível.
Sophie Ristelhueber opta por cenários reais, e terminado o conflito vai ao Koweit, no terreno onde se desenrolou a guerra, alterna vistas a partir do solo com vistas aéreas do deserto. A sua série Fait de 1992, é o testemunho dos detalhes dos vestígios da guerra. Em grande formato (1 metro x 1 metro e 30) sem referência de escala, para desorientar quem vê, as fotografias mostram quer as marcas dos objectos pessoais quer as marcas de destruição bélica deixadas no terreno pela artilharia de guerra. Dois anos mais tarde, a série Every One é um trabalho de maturação das guerras que testemunhou. Corpos anónimos submetidos a cirurgias são fotografados num hospital de Paris. As cicatrizes desses corpos representam as marcas deixadas dessa guerra. A sua fotografia, exposta em galerias, obriga-nos a uma reflexão sobre as consequências da guerra. Para Jeff Wall e Sophie Ristelhueber o documento não está em crise, antes rompeu com a ideia tradicional que o limitava ao real, do testemunho do "ter estado lá".
Hoje as fotografias de Wall, Ruff e Ristelhueber atingem preços elevados no mercado artístico. Se durante muito tempo a fotografia documental foi condenada ao arquivo por julgar-se um género sem possibilidades criativas hoje a sobreposição entre a fotografia artística e a fotografia documental é cada vez maior.
É necessário redefinir a noção do que é documental?

2 comentários:

rodrigo de oliveira disse...

olá!
parabéns pelo artigo, muito bom!
estou desenvolvento um projeto de fotografia documental e seu texto me ajudou bastante. obrigado.

rodrigo de oliveira.

Rita Rocha disse...

parabens pelo artigo. muito interessante e obrigada pela partilha.