Ao ler no jornal Público de domingo uma entrevista a Mark Porter, “um dos melhores em design editorial e criou a imagem do novo Público – o que estará nas bancas a partir de amanhã”, confirmamos a crise porque passam os jornais. Crise logo revelada no início da entrevista: “Como pensa que vai ser o futuro dos jornais?”, a que Porter responde “...Os jornais não terão um futuro muito longo como meio de comunicação de massas...”. É preciso renovar, mas Porter não acredita que o design por si só possa resolver o problema, os jornais não oferecem o que as pessoas querem ler, continua. Um pouco mais à frente “O que é que nos pode dizer sobre o redesign do Público?” Porter diz-nos que o Público é um jornal sério e inteligente, e o design actual mostra isso, mas também o mostra cinzento e chato. Por isso, continua, a essência do projecto consistiu em preservar essa seriedade e autoridade, mas ao mesmo tempo torná-lo mais legível e visualmente interessante para os leitores.
Toda esta crise me levou a pensar no jornal L’Illustration, criado em 1843, e o sucesso que obteve pelas suas ideias inovadoras. Se quisermos pôr um ovo de pé, continuamos hoje a utilizar a ideia de Colombo. Os jornais da actualidade preferem o redesign para os manter de pé. O mercado o dirá. O artigo de Thierry Gervais da EHESS-Paris III, “ D’après photographie, premiers usages de la photographie dans le journal L’Illustration”, fala-nos da sua investigação ao arquivo do L’Illustration e que passo a expôr.
Após o anúncio oficial da invenção da fotografia em 1939 por Arago, na Academia das Ciências em Paris, houve logo quem se interessa-se em descobrir um método que a reproduzisse de forma mecânica. Niépce de Saint-Victor, Lemercier, Négre, Talbot, Poitevin, foram alguns dos que se lançaram em experiências que visavam a reprodução fotomecânica. Poitevin foi no entanto o que consegiu um método mais simples e eficaz. Contudo nenhum dos métodos conseguia juntar imagens com os caractéres tipográficos. Só com a similigravura tal foi possível, e é só em 1880 que o Daily Graphic de Nova Iorque, publica a primeira fotografia reproduzida a partir do original.
Mas antes mesmo da invenção fotográfica, os jornais já eram ilustrados. Tendo como base o desenho, o método de reprodução através da gravura permitia aos jornais juntar texto com ilustrações, e os aperfeiçoamentos sucessivos permitiram que no início do século XIX, a boa qualidade das ilustrações associada a um redução de custos, possibilitassem a vulgarização dos jornais ilustrados. O semanário L’Illustration, como o próprio nome indica, foi um jornal que apostou na ilustração como uma nova forma de informar os leitores. Em 1843, quando surgiu, o L’Illustration dizia o seguinte: “Combien les descriptions écrites, même les meilleures, sont pâles, inanimés, toujours incomplètes et difficiles à comprendre, en comparaison de la représentation même des choses...Les choses qui arrivent à l’esprit par l’oreille sont moins facile à retenir que celles qui arrivent par les yeux”. Mesmo os iletrados poderiam a partir da ilustração compreender a notícia e também facto importante, a realidade parecia mais próxima. Mas onde reside a novidade deste semanário?
O jornal é idealizado em função das imagens, são elas que orientam a escolha editorial.
L’Illustration, veio renovar completamente o meio jornalístico. Para dar uma ideia, La Presse utilizava 23 000 palavras por página, o L’Illustration 11 000, o texto era um elemento gráfico, que acompanhava as imagens. Impresso em duas folhas, frente e verso, as folhas eram depois dobradas em quatro, formando um jornal com 16 páginas. Para não perder a qualidade de impressão das gravuras as imagens eram colocadas num lado só, o que implicava que na dobragem das folhas as ilustrações ficavam nas páginas 1,4,5,8,9,12,13 e 16. Importante saber isto? Sim, toda a paginação era concebida em função das páginas ocupadas pelas imagens.
Para exemplificar a reportagem “Californie. San Francisco et Sacramento”
Hoje, os jornais como diz Porter são “cinzentos e chatos”e sofrem com a concorrência feroz da internet...É preciso, diz-nos Porter, “...perceber os pontos fortes e fracos de cada um dos suportes. A internet é muito boa para notícias rápidas, para actualizações,...mas os dois suportes são complementares,... e temos de explorar essa complementaridade...A fotografia, é um outro recurso que funciona melhor no papel. ...no entanto, temos de ter muito cuidado como usamos a cor: se usamos muita cor ou cores muito fortes, acabamos por ter um jornal demasiado popular”.
Ontem comprei o Público. No editorial lemos “Os jornais impressos enfrentam hoje o seu maior desafio desde que entraram nos hábitos dos cidadãos e revolucionaram a intervenção democrática, nos primórdios do século XIX.”mais à frente “ A generalização da banda larga pulverizou radicalmente os canais de distribuição da informação. O surgimento dos blogues alargou o espectro do debate público. A facilidade de colocar na rede textos, sons e imagens dessacralizou a função dos jornalistas e alterou irremediavelmente a superfície de contacto entre a informação e os seus destinatários...”.
A ideia do novo jornal redesenhado por Porter é “cada vez que viramos uma página devemos ter uma surpresa”.
Estas são algumas das surpresas...
Édouard Charton, foi génio, as imagens não eram utilizadas como ornamento, e o debate público, hoje nos blogues, era a essência do jornal.
Boa sorte para o Público.
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