Durante o Verão de 2006 a sobrevalorização das casas na América ultrapassava os cinquenta por cento, mas nalgumas áreas metropolitanas, como Miami, área costeira, terra de sol e calor, a sobrevalorização era bem mais grave e os preços da habitação estavam ainda mais desfasados daquilo que os indicadores económicos de base poderiam justificar.
Axel Hütte, Miami, Fortune Hotel, 2006
Em 2006, de uma janela do Fortune Hotel em Miami, Axel Hütte, fotografa à noite uma cidade iluminada que parece não ter fim.
Provavelmente também de uma janela de um Hotel, Cartier-Bresson, em 1956, tira em Miami, esta fotografia.
Henri Cartier-Bresson, Miami, 1956
Tirada de manhã, veja-se a sombra do massagista reflectida no muro branco e o lençol, também ele branco ainda com vincos do engomado à espera dos madrugadores, Miami, onde os edifícios brancos proliferam, acorda com a luz do sol. O branco que tudo reflecte, a soma das cores do arco-íris, contrasta com o céu preto da Miami de Hütte, que tudo absorve, não deixando escapar nada.
Em 2006, Alan Greenspan, deixava a presidência da Reserva Federal. Em 1956, no ano em que Cartier-Bresson se passeava por Miami, William McChesney Martin Jr, presidia à Reserva Federal. Tal como o contraste entre o branco de Bresson e o preto de Hütte, as filosofias monetárias destes dois homens, não podiam ter sido mais diferentes e hoje, a declaração, “tirar a taça do ponche quando a festa se anima”, de William McChesney, é constantemente lembrada, pois para muitos, Greenspan, embora reconhecesse uma “exuberância irracional” continuou a encher os copos de ponche.
Os céus pretos de Hütte, sinal de premonição? Aviso? Presságio do que em breve estaria para acontecer?
Axel Hütte, Las Vegas, Caesar's Palace, 2003
Axel Hütte, Las Vegas, Mandalay I, 2003
Axel Hütte, Las Vegas, Rampart, 2003
Dos elevados gastos orçamentais, à redução das taxas de juro a zero, à diminuição de impostos, às injecções maciças de liquidez nos bancos, nada parece afinal revelar-se eficaz. Mas o mundo, como escrevia ontem um colunista no New York Times, olha para a América, à espera de um sinal, de uma luz,
Axel Hütte, Los Angeles, Standard Hotel, 2003
Axel Hütte, Bryant Park, 2003
mas que remédio oferece Washington?
Em Atlanta, o vermelho da CNN destoa dos azuis e amarelos,
Axel Hütte, Atlanta, CNN, 2005
e se Washington não oferece remédios, esta agência de notícias destoa ao dar dicas aos americanos “How to hang on to your Job”.
Quarta-feira, Barack Obama foi ao Congresso fazer um “discurso da esperança”
Axel Hütte, New York-Orleans, LV, 2003
e uma jornalista portuguesa acreditou no poder das suas palavras: “Obama devolve esperança que a América vai recuperar e emergir mais forte do que nunca”, mas a queda acentuada dos mercados bolsistas deram a verdadeira resposta - os americanos já nem na retórica dos políticos acreditam, restabelecer a confiança através das palavras também já não é eficaz.
Ao longo das várias crises que o mundo foi passando, criou-se a ideia de que Washington possuía recursos e conhecimentos para as conter. Mas a crise, que irrompeu em 2007, apanhou todos desprevenidos, e os limites de poder da Reserva Federal estão agora bem à vista.
Axel Hütte, Stratosphere Tower, 2003
Impotência política, poderia ser o nome deste post, mas não quero enganar mais os pesquisadores do google, que nos últimos tempos entram neste blog em barda à busca da Crise Financeira, da Grande Depressão dos anos 30 …procuram assuntos sérios e certamente estão à espera de textos em tom solene. Saisdeprata-e-pixels é um blog de fotografia, Axel Hütte é um nome apropriado para não enganar ninguém.
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quinta-feira, fevereiro 26, 2009
sexta-feira, fevereiro 20, 2009
Josef Sudek
Há dois dias, numa conversa entre amigos sobre “photobooks”, lembrei a edição original, “RFK Funeral Train”, 1999, de Paul Fusco, que The Photographer’s Gallery, editara, em “print-on-demand”.
Em 1968, no lobby do Ambassador Hotel de Los Angeles, Robert F. Kennedy era assassinado. No comboio onde seguia o caixão - o candidato a presidente seria sepultado no Arlington National Cemetery de Nova Iorque – Fusco fotografou da janela, um povo consternado que lhe prestava a última homenagem.
Paul Fusco, "RFK Funeral Train", 1999
No dia seguinte, na edição Internet do Washington Post, um link, numa coluna à esquerda das notícias principais, conduzia-nos a “Chernobyl Legacy” de Paul Fusco, que o jornal patrocina. Lembrei-me de Milan Kundera, (A insustentável leveza do ser), que estivera a ler na noite anterior: “A nossa vida quotidiana está sempre a ser bombardeada pelos acasos, mais exactamente por encontros fortuitos entre pessoas e os acontecimentos, ou seja, por aquilo a que costuma chamar-se coincidências”.
Mais à frente, no romance, Tereza, queria ser fotógrafa, e ainda um pouco mais à frente, no mesmo ano que Robert Kennedy era assassinado, lia: “A invasão da Checoslováquia em 1968 foi, pelo contrário, fotografada, filmada e arrumada nos arquivos do mundo inteiro”. A descrição das fotografias que Tereza tirou nesse dia em Praga - dos tanques russos, prédios destruídos, punhos ameaçadores e mortes – lembram as fotografias do checo Josef Koudelka.
Já na Suiça, para onde se exilara, Tereza foi oferecê-las a uma revista de grande tiragem. “O chefe de redacção recebeu-a amavelmente, …, convidou-a a sentar-se num sofá, examinou as fotografias, elogiou-as, para depois explicar que não tinham qualquer hipótese de publicação (“por muito bonitas que sejam!”). Já se passara tempo de mais sobre os acontecimentos. Mas em Praga tudo continua na mesma!, exclamou Tereza, com indignação, tentando explicar, que naquele preciso instante, no seu país ocupado, contra tudo e contra todos, se constituíam conselhos operários nas fábricas, os estudantes continuavam em greve e toda a população continuava a viver como muito bem entendia. Isso é que era incrível! E era precisamente isso que já não interessava ninguém!”.
Já se passou tempo demais, será que “Chernobyl Legacy” de Fusco ainda interessa alguém? Não ficará em breve arrumada nos arquivos da Magnum?
Regresso às primeiras páginas do livro: “Que escolher? o peso ou a leveza? Foi a questão com que se debateu Parménides, no século VI a.C. Para ele, o Universo estava dividido em pares de contrários: luz-sombra; espesso-fino; quente-frio; ser-não ser. Considerava que um dos pólos da contradição era positivo e o outro, negativo. Esta divisão em pólos positivos e negativos pode parecer de uma facilidade pueril. Excepto num caso: o que é positivo: o peso ou a leveza?”
Recuemos no tempo, 15 de Março de 1939, Praga era ocupada pelos alemães. Tudo mudava, e fotografar foi proibido. Josef Sudek, refugia-se no seu estúdio no jardim da sua casa. O vidro da janela, não do comboio mas do seu estúdio, separa dois mundos em pares contrários: interior-exterior.
Das duas janelas - uma virada para o jardim, outra para os blocos de apartamentos - qual escolher?
A janela com o herói, (a árvore retorcida do jardim),
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1950
ou a janela das traseiras, que nos trás a atmosfera da cidade?
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Noite-Dia; Inverno-Primavera, Interior-Exterior. Duas janelas, pares contrários?
Para Sudek o mistério é algo recôndito, difícil de comunicar, que está para além da realidade objectiva, enfim, como disse à sua amiga Anna Fárová difícil de descrever em fotografia.
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Para Kundera uma coisa é certa: a contradição pesado-leve é a mais misteriosa e ambígua de todas as contradições.
Mas o acaso, aquilo a que costuma chamar-se de coincidências, não será também um dos grandes mistérios?
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Em 1968, no lobby do Ambassador Hotel de Los Angeles, Robert F. Kennedy era assassinado. No comboio onde seguia o caixão - o candidato a presidente seria sepultado no Arlington National Cemetery de Nova Iorque – Fusco fotografou da janela, um povo consternado que lhe prestava a última homenagem.
Paul Fusco, "RFK Funeral Train", 1999
No dia seguinte, na edição Internet do Washington Post, um link, numa coluna à esquerda das notícias principais, conduzia-nos a “Chernobyl Legacy” de Paul Fusco, que o jornal patrocina. Lembrei-me de Milan Kundera, (A insustentável leveza do ser), que estivera a ler na noite anterior: “A nossa vida quotidiana está sempre a ser bombardeada pelos acasos, mais exactamente por encontros fortuitos entre pessoas e os acontecimentos, ou seja, por aquilo a que costuma chamar-se coincidências”.
Mais à frente, no romance, Tereza, queria ser fotógrafa, e ainda um pouco mais à frente, no mesmo ano que Robert Kennedy era assassinado, lia: “A invasão da Checoslováquia em 1968 foi, pelo contrário, fotografada, filmada e arrumada nos arquivos do mundo inteiro”. A descrição das fotografias que Tereza tirou nesse dia em Praga - dos tanques russos, prédios destruídos, punhos ameaçadores e mortes – lembram as fotografias do checo Josef Koudelka.
Já na Suiça, para onde se exilara, Tereza foi oferecê-las a uma revista de grande tiragem. “O chefe de redacção recebeu-a amavelmente, …, convidou-a a sentar-se num sofá, examinou as fotografias, elogiou-as, para depois explicar que não tinham qualquer hipótese de publicação (“por muito bonitas que sejam!”). Já se passara tempo de mais sobre os acontecimentos. Mas em Praga tudo continua na mesma!, exclamou Tereza, com indignação, tentando explicar, que naquele preciso instante, no seu país ocupado, contra tudo e contra todos, se constituíam conselhos operários nas fábricas, os estudantes continuavam em greve e toda a população continuava a viver como muito bem entendia. Isso é que era incrível! E era precisamente isso que já não interessava ninguém!”.
Já se passou tempo demais, será que “Chernobyl Legacy” de Fusco ainda interessa alguém? Não ficará em breve arrumada nos arquivos da Magnum?
Regresso às primeiras páginas do livro: “Que escolher? o peso ou a leveza? Foi a questão com que se debateu Parménides, no século VI a.C. Para ele, o Universo estava dividido em pares de contrários: luz-sombra; espesso-fino; quente-frio; ser-não ser. Considerava que um dos pólos da contradição era positivo e o outro, negativo. Esta divisão em pólos positivos e negativos pode parecer de uma facilidade pueril. Excepto num caso: o que é positivo: o peso ou a leveza?”
Recuemos no tempo, 15 de Março de 1939, Praga era ocupada pelos alemães. Tudo mudava, e fotografar foi proibido. Josef Sudek, refugia-se no seu estúdio no jardim da sua casa. O vidro da janela, não do comboio mas do seu estúdio, separa dois mundos em pares contrários: interior-exterior.
Das duas janelas - uma virada para o jardim, outra para os blocos de apartamentos - qual escolher?
A janela com o herói, (a árvore retorcida do jardim),
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1950
ou a janela das traseiras, que nos trás a atmosfera da cidade?
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Noite-Dia; Inverno-Primavera, Interior-Exterior. Duas janelas, pares contrários?
Para Sudek o mistério é algo recôndito, difícil de comunicar, que está para além da realidade objectiva, enfim, como disse à sua amiga Anna Fárová difícil de descrever em fotografia.
Josef Sudek, The Window of My Studio, 1940-54
Para Kundera uma coisa é certa: a contradição pesado-leve é a mais misteriosa e ambígua de todas as contradições.
Mas o acaso, aquilo a que costuma chamar-se de coincidências, não será também um dos grandes mistérios?
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Mundos Sublimes
quarta-feira, fevereiro 18, 2009
Regreso à ordem
Em 1932, no auge da Grande Depressão, a taxa de desemprego dos Estados Unidos disparava para um número inacreditável: 25% da população activa via-se sem trabalho.
Com a grave crise económica, que se alastra há mais de um ano, as comparações com a Grande Depressão são inevitáveis, e a Mãe Migrante, (1936), Florence Thompson, a viúva de trinta e dois anos com seis filhos, que Dorothea Lange fotografou em Nipomo, na Califórnia, salta novamente para as páginas dos jornais, como o retrato icónico da Grande Depressão.
Walker Evans, Morgantown West Viriginia, 1935, do livro American Photographs, 1938
Esta fotografia documental, Mãe Migrante, como revela o próprio título, conta a migração, em direcção à Califórnia, das milhares de famílias, oriundas da bacia de areia do estado do Oklahoma, que não tiveram outra alternativa, senão deixar para trás as suas terras fustigadas pela seca. Agora, retirada do contexto, é reduzida a mera ilustração de textos que proliferam sobre a actual crise. A falta de imaginação, criatividade e até de bom-senso, (quem afinal hoje se importa com estas coisas? não estão todos fartos do sentimentalismo e lamechices dos humanistas?), alastra-se entre os jornais e revistas e infelizmente também na blogosfera.
Walker Evans, numa nota sobre o seu livro, “American Photographs”, 1938, o livro mais importante da Grande Depressão, escrevia: “a história é feita de múltiplos momentos e o fotógrafo não tem necessidade de batalhas militares para fornecer imagens dos conflitos…mas precisamos de ver mais sobre a nossa época, muito para além das ilustrações dos jornais da manhã”. Evans se ainda fosse vivo, certamente diria, precisamos de ver mais…
No ano em que Lange tirou a fotografia, 1936, Roosevelt era reeleito, passavam seis anos do crash, e o presidente ainda declarava: “Vejo um terço da nação mal alojado, mal vestido e mal alimentado”. Walker Evans, tal como Lange e tantos outros fotógrafos, que trabalharam para a “Farm Security Administration”, vulgo FSA, tinham como objectivo abrir os olhos da população, dando conta da realidade por que passava o país.
Com os efeitos da crise de 1929, um retorno ao real, era visível ao nível das artes em geral, quer na América como na Europa. Sem renunciarem à liberdade criativa, os artistas confrontavam-se com a realidade objectiva onde procuravam um novo rigor, deixando para trás, todos os ismos, (cubismo, surrealismo, construtivismo…) dos anos anteriores. “Regresso à ordem”, foi como os críticos classificaram os movimentos artísticos desta década, que a Europa via terminar, 1939, com a Polónia invadida.
Pintar e fotografar o que viam à sua volta, dentro de uma linha que denunciava a tragédia social desencadeada pela depressão económica, converteu-se no meio de se chegar ao significado essencial das coisas, a decadência da sociedade. Na América, Edward Hopper, Grant Wood, Thomas Benton…, os “American Scene”, na frontalidade de um alinhamento de casas de uma Rua Principal (Main Street),
Edward Hopper, Early Sunday Morning, 1930
Walker Evans, Main Street Block, Selma, Alabama, 1936
acabaram por retratar a verdadeira atmosfera do país. Walker Evans, que em 1929, ainda sob influência dos ismos, fotografava a Brookline Bridge de Nova Iorque, também se fartava do grafismo da Nova Objectividade alemã, teorizada por László Moholy-Nagy. Em 1935, numa viajem ao sul pobre do algodão, a preferência nítida pela frontalidade, é-nos dada na arquitectura destas casas sulistas.
Walker Evans, New Orleans Houses, 1935
Walker Evans, French Quarter House in New Orleans, 1935
De uma simplicidade espantosa, muito próximo do estilo anónimo dos bilhetes postais,
Bilhete Postal, colecção Walker Evans, West Evans Street, Florence, South Carolina, c. 1910
Walker Evans, Greensboro, Alabama, 1936
que tanto gostava e coleccionava, a tipologia das casas, era para ele suficiente, a casa, o abrigo sagrado desta gente, no alpendre,
Walker Evans, New Orleans, Louisiana,1935
o local ideal para o retrato de família. Em 1947, em companhia de Truman Capote, Cartier-Bresson, percorre a mesma região. Em New Orleans, talvez por se sentir em França, Bresson, entra pela porta que Evans deixara aberta – e encontra o sagrado nos gestos e atitudes, mais do que nas coisas.
Henri Cartier-Bresson, New Orleans, 1947
Regressemos à primeira imagem, à Rua Principal (Main Street) duma cidade tipo americana, que por acaso se chama Morgantown, onde dois jovens, de olhar desconfiado estão encostados a um Banco. Morgantown, será a terra do banqueiro com o mesmo nome?
“Morgantown, West Virgínia”, é a prancha #39, da primeira parte do livro “American Photographs”. A fotografia que a antecede, #38, é tirada em Truro no Massachustts, e corresponde ao interior de uma casa portuguesa,
Walker Evans, Interior Detail of Portuguese House, 1930
e antes desta, estamos novamente em New Orleans, numa pensão que aluga quartos por $1.00.
Obcecado em romper com o standard da imagem única dos jornais, Evans, colecciona em “American Photographs” um conjunto de imagens que sabiamente organiza,
(e o fotógrafo não tem necessidade de batalhas militares para fornecer imagens dos conflitos)
e que se enriquecem na companhia uma das outras, ver mais aqui. Em comum, o facto de serem tiradas num mesmo país.
Evans se fosse vivo, ao ver Mãe Migrante a servir de mera ilustração, diria certamente, é preciso ver mais…
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Com a grave crise económica, que se alastra há mais de um ano, as comparações com a Grande Depressão são inevitáveis, e a Mãe Migrante, (1936), Florence Thompson, a viúva de trinta e dois anos com seis filhos, que Dorothea Lange fotografou em Nipomo, na Califórnia, salta novamente para as páginas dos jornais, como o retrato icónico da Grande Depressão.
Walker Evans, Morgantown West Viriginia, 1935, do livro American Photographs, 1938
Esta fotografia documental, Mãe Migrante, como revela o próprio título, conta a migração, em direcção à Califórnia, das milhares de famílias, oriundas da bacia de areia do estado do Oklahoma, que não tiveram outra alternativa, senão deixar para trás as suas terras fustigadas pela seca. Agora, retirada do contexto, é reduzida a mera ilustração de textos que proliferam sobre a actual crise. A falta de imaginação, criatividade e até de bom-senso, (quem afinal hoje se importa com estas coisas? não estão todos fartos do sentimentalismo e lamechices dos humanistas?), alastra-se entre os jornais e revistas e infelizmente também na blogosfera.
Walker Evans, numa nota sobre o seu livro, “American Photographs”, 1938, o livro mais importante da Grande Depressão, escrevia: “a história é feita de múltiplos momentos e o fotógrafo não tem necessidade de batalhas militares para fornecer imagens dos conflitos…mas precisamos de ver mais sobre a nossa época, muito para além das ilustrações dos jornais da manhã”. Evans se ainda fosse vivo, certamente diria, precisamos de ver mais…
No ano em que Lange tirou a fotografia, 1936, Roosevelt era reeleito, passavam seis anos do crash, e o presidente ainda declarava: “Vejo um terço da nação mal alojado, mal vestido e mal alimentado”. Walker Evans, tal como Lange e tantos outros fotógrafos, que trabalharam para a “Farm Security Administration”, vulgo FSA, tinham como objectivo abrir os olhos da população, dando conta da realidade por que passava o país.
Com os efeitos da crise de 1929, um retorno ao real, era visível ao nível das artes em geral, quer na América como na Europa. Sem renunciarem à liberdade criativa, os artistas confrontavam-se com a realidade objectiva onde procuravam um novo rigor, deixando para trás, todos os ismos, (cubismo, surrealismo, construtivismo…) dos anos anteriores. “Regresso à ordem”, foi como os críticos classificaram os movimentos artísticos desta década, que a Europa via terminar, 1939, com a Polónia invadida.
Pintar e fotografar o que viam à sua volta, dentro de uma linha que denunciava a tragédia social desencadeada pela depressão económica, converteu-se no meio de se chegar ao significado essencial das coisas, a decadência da sociedade. Na América, Edward Hopper, Grant Wood, Thomas Benton…, os “American Scene”, na frontalidade de um alinhamento de casas de uma Rua Principal (Main Street),
Edward Hopper, Early Sunday Morning, 1930
Walker Evans, Main Street Block, Selma, Alabama, 1936
acabaram por retratar a verdadeira atmosfera do país. Walker Evans, que em 1929, ainda sob influência dos ismos, fotografava a Brookline Bridge de Nova Iorque, também se fartava do grafismo da Nova Objectividade alemã, teorizada por László Moholy-Nagy. Em 1935, numa viajem ao sul pobre do algodão, a preferência nítida pela frontalidade, é-nos dada na arquitectura destas casas sulistas.
Walker Evans, New Orleans Houses, 1935
Walker Evans, French Quarter House in New Orleans, 1935
De uma simplicidade espantosa, muito próximo do estilo anónimo dos bilhetes postais,
Bilhete Postal, colecção Walker Evans, West Evans Street, Florence, South Carolina, c. 1910
Walker Evans, Greensboro, Alabama, 1936
que tanto gostava e coleccionava, a tipologia das casas, era para ele suficiente, a casa, o abrigo sagrado desta gente, no alpendre,
Walker Evans, New Orleans, Louisiana,1935
o local ideal para o retrato de família. Em 1947, em companhia de Truman Capote, Cartier-Bresson, percorre a mesma região. Em New Orleans, talvez por se sentir em França, Bresson, entra pela porta que Evans deixara aberta – e encontra o sagrado nos gestos e atitudes, mais do que nas coisas.
Henri Cartier-Bresson, New Orleans, 1947
Regressemos à primeira imagem, à Rua Principal (Main Street) duma cidade tipo americana, que por acaso se chama Morgantown, onde dois jovens, de olhar desconfiado estão encostados a um Banco. Morgantown, será a terra do banqueiro com o mesmo nome?
“Morgantown, West Virgínia”, é a prancha #39, da primeira parte do livro “American Photographs”. A fotografia que a antecede, #38, é tirada em Truro no Massachustts, e corresponde ao interior de uma casa portuguesa,
Walker Evans, Interior Detail of Portuguese House, 1930
e antes desta, estamos novamente em New Orleans, numa pensão que aluga quartos por $1.00.
Obcecado em romper com o standard da imagem única dos jornais, Evans, colecciona em “American Photographs” um conjunto de imagens que sabiamente organiza,
(e o fotógrafo não tem necessidade de batalhas militares para fornecer imagens dos conflitos)
e que se enriquecem na companhia uma das outras, ver mais aqui. Em comum, o facto de serem tiradas num mesmo país.
Evans se fosse vivo, ao ver Mãe Migrante a servir de mera ilustração, diria certamente, é preciso ver mais…
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Política
sexta-feira, fevereiro 13, 2009
Memória
Como é que, uma quanta matéria enrugada, na nossa medula espinal, é capaz de preservar durante uma vida inteira, recordações banais da infância, e outras vezes, nem um número de telefone consegue fixar durante mais de um minuto?
Porque nos lembramos de algumas fotografias, porque nos esquecemos de outras?
A franco-algeriana, Zineb Sedira, numa margem do mar mediterrâneo, surpreendeu estes dois navios encostados. Na linha do horizonte, percebemos uma cidade, Argel? Marselha?
Zineb Sedira, "The Lovers", 2008
Uma memória de infância (preservada na medula de Sedira) - uma viajem com a mãe à Argélia – será o ponto de partida para o trabalho que agora expõe no New Art Exchange de Nottingham.
A memória é estranha e não pára de surpreender. Na sua obra magnífica – “Em Busca do Tempo Perdido”, ao narrador de Proust, bastava-lhe saborear uma pequena madalena para o transportar aos tempos passados.
Há uns meses, numa apresentação sobre Sistemas de Informação Geográfica a arte da memória, do poeta grego Simónides de Ceos, era invocada, para explicar os diversos domínios em que esta nova técnica nos pode servir. Reza então a história, que Simónides fora o único sobrevivente do desmoronamento catastrófico do telhado de um salão de banquetes na Tessália. Os cadáveres ficaram de tal maneira desfigurados que não foi possível reconhecê-los. Simónides, fechando os olhos ao caos, foi capaz de visualizar na sua mente cada convidado no respectivo lugar em redor da mesa, e identificou assim cada um dos cadáveres. Simónides, descobria uma técnica preciosa de memorização, o chamado “método dos lugares”, que se vulgarizou numa época, onde os livros rareavam, e a memória era encarada com respeito.
Hoje, com os apoios tecnológicos, desde os Sistemas de Informação Geográfica à fotografia, “para mais tarde recordar” como lembrava a Kodak, mudaram profundamente a nossa forma de memorizar.
Em japonês, shashin, é o termo que designa fotografia. Muito antes da invenção de Niepce, no século VIII, o termo shashin, era utilizado pela primeira vez num texto de um poeta chinês, Tang Du Fu, que etimologicamente significa, “reprodução do real”. No Ocidente, é do grego que nasce o termo fotografia, e etimologicamente significa “desenhar com a luz”. Na cultura Ocidental, é a primeira - a ideia de que a fotografia é a reprodução do real - que prevalecerá, embora houve quem logo dissesse que a fotografia não era a reprodução do real, mas artifício de uma óptica submetida à perspectiva albertiniana. O certo é que, para a maioria das pessoas, com a nova invenção, o passado passava a ser tão seguro como o presente, aquilo que se via no papel era tão real, como aquilo que se palpava. Para o narrador de Proust, a fotografia dava-lhe uma sensação tão segura como a recordação. Um dia, ao baixar-se para se descalçar, no seu quarto, no Grand Hotel de Balbec, viu bruscamente na sua memória, a última fotografia que Saint-Loup tirara à sua avó, e “cuja realidade viva eu encontrava pela primeira vez numa recordação involuntária e completa”. Nobuyoshi Araki, numa entrevista que deu há dias, (Art Press, Fevereiro 2009), recorda-se da última fotografia que tirou ao seu pai : “se não lhe tirasse uma fotografia, iria esquecê-lo, mas ao fotografa-lo, ficará para sempre na minha memória”.
No país do shashin, gravadas na memória, ficaram as palavras do imperador Hirohito, quando, a 15 de Agosto de 1945, declarava ao mundo a rendição do Japão : “temos de suportar o insuportável”, e o insuportável foi fotografado para que ficasse na memória colectiva. Olhar para as fotografias da tragédia, dos corpos destroçados, interessa-nos porque nos interessamos pelo mundo, mas os efeitos da destruição, demasiado impressivos, são consumidos no instante e rapidamente nos esquecemos, porque a simples repetição do real, embota e cansa a sensibilidade. Porém, “são os traços fugidios que acabam por se revelar os mais perduráveis”, ensina-nos Shomei Tomatsu, que em 1961, fotografou, a inesquecível garrafa derretida e deformada pela bomba atómica. Trinta anos depois, Hiroshi Sugimoto, nas suas séries intemporais, fotografa um tempo, mas um tempo agora anterior à memória para superar o insuportável.
Só memorizamos as fotografias que nos ensinam ou fazem pensar, e isso acontece, quando a fotografia se anula enquanto reprodução do real e passa a ser a própria coisa.
Proust entendeu-o, e Charlus, no salão da Madame Villeparisis, em conversa com a sua prima Clara de Chimay clarifica: “Ao mostrar coisas que já não existem, a fotografia deixou de ser uma mera reprodução do real e adquiriu a dignidade que lhe faltava”.
Zineb Sedira, "Haunted House II", 2006
Nesta mansão em Argel, Sedira, mostra-nos coisas que já não existem. A casa, construída nos anos de 1930, por arquitectos franceses, mesmo em ruínas que ainda se mantêm, o que nos chama a atenção, o que já não existe, é a decoração árabe do passado que ainda vemos num dos torreões.
No trabalho de Sedira, que nasceu em França, mas é filha de emigrantes argelinos, a procura da identidade, é o seu tema central.
A bordo de um navio, no mediterrâneo, no mar que une Argel e Marselha,
Zineb Sedira, "Middle Sea", 2008
numa conjugação harmoniosa entre passado e presente, evoca, ao percorrer o mesmo caminho, de mais de um milhão de pessoas, que foi a descolonização da Argélia, as memórias de um êxodo, mas simultaneamente, no presente, ao fazer o trajecto, evoca, as boas relações das duas nações, que depois de terem lutado durante tanto tempo e tão duramente, servem de exemplo, sendo, para muitos, um caso excepcional em geopolítica.
Argel, Marselha e o mediterrâneo que as une, a resposta da identidade que procura.
Na Antiguidade, onde os livros rareavam, Simónides, através da memória interna, identificava os corpos desfigurados pelo fogo. Na actualidade, submersos num excesso de informação, onde dificilmente distinguimos o banal do importante, a fotografia, uma memória externa, quando é boa, deixa que os pormenores importantes da vida não sejam esquecidos e nos subam à consciência.
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Porque nos lembramos de algumas fotografias, porque nos esquecemos de outras?
A franco-algeriana, Zineb Sedira, numa margem do mar mediterrâneo, surpreendeu estes dois navios encostados. Na linha do horizonte, percebemos uma cidade, Argel? Marselha?
Zineb Sedira, "The Lovers", 2008
Uma memória de infância (preservada na medula de Sedira) - uma viajem com a mãe à Argélia – será o ponto de partida para o trabalho que agora expõe no New Art Exchange de Nottingham.
A memória é estranha e não pára de surpreender. Na sua obra magnífica – “Em Busca do Tempo Perdido”, ao narrador de Proust, bastava-lhe saborear uma pequena madalena para o transportar aos tempos passados.
Há uns meses, numa apresentação sobre Sistemas de Informação Geográfica a arte da memória, do poeta grego Simónides de Ceos, era invocada, para explicar os diversos domínios em que esta nova técnica nos pode servir. Reza então a história, que Simónides fora o único sobrevivente do desmoronamento catastrófico do telhado de um salão de banquetes na Tessália. Os cadáveres ficaram de tal maneira desfigurados que não foi possível reconhecê-los. Simónides, fechando os olhos ao caos, foi capaz de visualizar na sua mente cada convidado no respectivo lugar em redor da mesa, e identificou assim cada um dos cadáveres. Simónides, descobria uma técnica preciosa de memorização, o chamado “método dos lugares”, que se vulgarizou numa época, onde os livros rareavam, e a memória era encarada com respeito.
Hoje, com os apoios tecnológicos, desde os Sistemas de Informação Geográfica à fotografia, “para mais tarde recordar” como lembrava a Kodak, mudaram profundamente a nossa forma de memorizar.
Em japonês, shashin, é o termo que designa fotografia. Muito antes da invenção de Niepce, no século VIII, o termo shashin, era utilizado pela primeira vez num texto de um poeta chinês, Tang Du Fu, que etimologicamente significa, “reprodução do real”. No Ocidente, é do grego que nasce o termo fotografia, e etimologicamente significa “desenhar com a luz”. Na cultura Ocidental, é a primeira - a ideia de que a fotografia é a reprodução do real - que prevalecerá, embora houve quem logo dissesse que a fotografia não era a reprodução do real, mas artifício de uma óptica submetida à perspectiva albertiniana. O certo é que, para a maioria das pessoas, com a nova invenção, o passado passava a ser tão seguro como o presente, aquilo que se via no papel era tão real, como aquilo que se palpava. Para o narrador de Proust, a fotografia dava-lhe uma sensação tão segura como a recordação. Um dia, ao baixar-se para se descalçar, no seu quarto, no Grand Hotel de Balbec, viu bruscamente na sua memória, a última fotografia que Saint-Loup tirara à sua avó, e “cuja realidade viva eu encontrava pela primeira vez numa recordação involuntária e completa”. Nobuyoshi Araki, numa entrevista que deu há dias, (Art Press, Fevereiro 2009), recorda-se da última fotografia que tirou ao seu pai : “se não lhe tirasse uma fotografia, iria esquecê-lo, mas ao fotografa-lo, ficará para sempre na minha memória”.
No país do shashin, gravadas na memória, ficaram as palavras do imperador Hirohito, quando, a 15 de Agosto de 1945, declarava ao mundo a rendição do Japão : “temos de suportar o insuportável”, e o insuportável foi fotografado para que ficasse na memória colectiva. Olhar para as fotografias da tragédia, dos corpos destroçados, interessa-nos porque nos interessamos pelo mundo, mas os efeitos da destruição, demasiado impressivos, são consumidos no instante e rapidamente nos esquecemos, porque a simples repetição do real, embota e cansa a sensibilidade. Porém, “são os traços fugidios que acabam por se revelar os mais perduráveis”, ensina-nos Shomei Tomatsu, que em 1961, fotografou, a inesquecível garrafa derretida e deformada pela bomba atómica. Trinta anos depois, Hiroshi Sugimoto, nas suas séries intemporais, fotografa um tempo, mas um tempo agora anterior à memória para superar o insuportável.
Só memorizamos as fotografias que nos ensinam ou fazem pensar, e isso acontece, quando a fotografia se anula enquanto reprodução do real e passa a ser a própria coisa.
Proust entendeu-o, e Charlus, no salão da Madame Villeparisis, em conversa com a sua prima Clara de Chimay clarifica: “Ao mostrar coisas que já não existem, a fotografia deixou de ser uma mera reprodução do real e adquiriu a dignidade que lhe faltava”.
Zineb Sedira, "Haunted House II", 2006
Nesta mansão em Argel, Sedira, mostra-nos coisas que já não existem. A casa, construída nos anos de 1930, por arquitectos franceses, mesmo em ruínas que ainda se mantêm, o que nos chama a atenção, o que já não existe, é a decoração árabe do passado que ainda vemos num dos torreões.
No trabalho de Sedira, que nasceu em França, mas é filha de emigrantes argelinos, a procura da identidade, é o seu tema central.
A bordo de um navio, no mediterrâneo, no mar que une Argel e Marselha,
Zineb Sedira, "Middle Sea", 2008
numa conjugação harmoniosa entre passado e presente, evoca, ao percorrer o mesmo caminho, de mais de um milhão de pessoas, que foi a descolonização da Argélia, as memórias de um êxodo, mas simultaneamente, no presente, ao fazer o trajecto, evoca, as boas relações das duas nações, que depois de terem lutado durante tanto tempo e tão duramente, servem de exemplo, sendo, para muitos, um caso excepcional em geopolítica.
Argel, Marselha e o mediterrâneo que as une, a resposta da identidade que procura.
Na Antiguidade, onde os livros rareavam, Simónides, através da memória interna, identificava os corpos desfigurados pelo fogo. Na actualidade, submersos num excesso de informação, onde dificilmente distinguimos o banal do importante, a fotografia, uma memória externa, quando é boa, deixa que os pormenores importantes da vida não sejam esquecidos e nos subam à consciência.
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terça-feira, fevereiro 10, 2009
Austrália - a terra dos fogos
A Austrália, o mais pequeno dos cinco continentes, mas a maior ilha do mundo, vive o Inferno. Mato e floresta ardem como fogos vindos do céu e a sua violência extrema, já causou o maior número de mortes de sempre. A temperatura, acima dos 46 graus Celsius, o valor mais alto desde que há registo, tornou a terra ainda mais quente e a seca, que se prolonga há sete anos, tornou-se ainda mais grave.
Há seis anos atrás, Dean Sewell, um nativo da terra dos fogos, fotografou este canguru,
Dean Sewell, Canguru, Janeiro 2003, Austrália
reduzido a estátua, depois do terrível incêndio, em Janeiro de 2003, atingir Canberra, a capital do país.
Na Austrália, o tempo meteorológico, é assunto político. A chuva, que deixou de cair, tornou o país cada vez mais vulnerável.
Nick Moir, Tempestade de areia, Uma herdade abandonada em Ivanhoe, durante uma tempestade de areia em 2002. Esta zona está em regime de seca desde 2001, forçando o abandono de muitas propriedades.
Em Abril de 2007, o então primeiro-ministro John Howard, do Partido Liberal, exultou os seus compatriotas a rezarem, “porque se não começar a chover, serei obrigado a proibir a distribuição de água para irrigação na bacia do rio Murray-Darling, que produz 40% dos produtos agrícolas do país”. Os australianos ficaram chocados, mas a reza, não foi suficiente, e a incapacidade de Howard, responder com orações, em lugar de políticas, fê-lo perder as eleições para o Partido Trabalhista de Kevin Rudd, que logo que tomou posse, entregou pessoalmente às Nações Unidas, um conjunto de ratificações do Protocolo de Quioto. Agora, o governo de Rudd, anunciou um fundo de cinco milhões de euros para apoio às vítimas.
Em terras como a Austrália, o berço de origem dos eucaliptos, o fogo florestal faz parte do ciclo vital da natureza. O eucalipto, apontado como uma das causas deste Inferno, despe a sua casca, que ainda incandescente, viaja, transportado pelos fortíssimos ventos, para quilómetros de distância, semeando novos fogos.
Dean Sewell, Árvore a arder, Janeiro de 2003, Austrália
Mesmo depois de arderem, como as cobras que mudam de pele, os eucaliptos renascem com facilidade - o mato ardido fertiliza a germinação das sementes. Se os nativos sabiam aproveitar os fogos espontâneos para seu proveito, os novos donos, impuseram outros hábitos de colonização, e como refere um investigador do Instituto Superior de Agronomia, “o que mudou foi o homem ter metido dentro da floresta as casas e provocado mais ignições”.
Em “Árvore a arder”, tirada pelo mesmo Dean Sewell, mostra a combustão de uma árvore, parcialmente morta, (que suga o ar, causando um vácuo) espirrando faúlhas e brasas incandescentes. Ao longe, exactamente como agora, um engarrafamento de trânsito com os condutores a procurarem escapar aos detritos em brasa que voam por todo o lado.
Na terra do fogo, rodeada por água, os nativos adaptaram-se ao seu ciclo vital. Os novos donos, mesmo elegendo novos governos, por alguma razão, não conseguem adaptar-se à terra dos fogos – os milhões de euros surgem após as catástrofes, a prevenção e combate,
Nick Moir, Helicóptero à descarga, Um helicóptero-jumbo despeja água nos subúrbios a norte de Sydney, ameaçados pelos fogos florestais, 5 Dezembro, 2002
que não foram suficientes, como revela o elevado número de mortes, são teimosamente esquecidos. Na Austrália, que parece povoada por espíritos, a Natureza domina o homem que insiste em não ver os seus sinais.
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Há seis anos atrás, Dean Sewell, um nativo da terra dos fogos, fotografou este canguru,
Dean Sewell, Canguru, Janeiro 2003, Austrália
reduzido a estátua, depois do terrível incêndio, em Janeiro de 2003, atingir Canberra, a capital do país.
Na Austrália, o tempo meteorológico, é assunto político. A chuva, que deixou de cair, tornou o país cada vez mais vulnerável.
Nick Moir, Tempestade de areia, Uma herdade abandonada em Ivanhoe, durante uma tempestade de areia em 2002. Esta zona está em regime de seca desde 2001, forçando o abandono de muitas propriedades.
Em Abril de 2007, o então primeiro-ministro John Howard, do Partido Liberal, exultou os seus compatriotas a rezarem, “porque se não começar a chover, serei obrigado a proibir a distribuição de água para irrigação na bacia do rio Murray-Darling, que produz 40% dos produtos agrícolas do país”. Os australianos ficaram chocados, mas a reza, não foi suficiente, e a incapacidade de Howard, responder com orações, em lugar de políticas, fê-lo perder as eleições para o Partido Trabalhista de Kevin Rudd, que logo que tomou posse, entregou pessoalmente às Nações Unidas, um conjunto de ratificações do Protocolo de Quioto. Agora, o governo de Rudd, anunciou um fundo de cinco milhões de euros para apoio às vítimas.
Em terras como a Austrália, o berço de origem dos eucaliptos, o fogo florestal faz parte do ciclo vital da natureza. O eucalipto, apontado como uma das causas deste Inferno, despe a sua casca, que ainda incandescente, viaja, transportado pelos fortíssimos ventos, para quilómetros de distância, semeando novos fogos.
Dean Sewell, Árvore a arder, Janeiro de 2003, Austrália
Mesmo depois de arderem, como as cobras que mudam de pele, os eucaliptos renascem com facilidade - o mato ardido fertiliza a germinação das sementes. Se os nativos sabiam aproveitar os fogos espontâneos para seu proveito, os novos donos, impuseram outros hábitos de colonização, e como refere um investigador do Instituto Superior de Agronomia, “o que mudou foi o homem ter metido dentro da floresta as casas e provocado mais ignições”.
Em “Árvore a arder”, tirada pelo mesmo Dean Sewell, mostra a combustão de uma árvore, parcialmente morta, (que suga o ar, causando um vácuo) espirrando faúlhas e brasas incandescentes. Ao longe, exactamente como agora, um engarrafamento de trânsito com os condutores a procurarem escapar aos detritos em brasa que voam por todo o lado.
Na terra do fogo, rodeada por água, os nativos adaptaram-se ao seu ciclo vital. Os novos donos, mesmo elegendo novos governos, por alguma razão, não conseguem adaptar-se à terra dos fogos – os milhões de euros surgem após as catástrofes, a prevenção e combate,
Nick Moir, Helicóptero à descarga, Um helicóptero-jumbo despeja água nos subúrbios a norte de Sydney, ameaçados pelos fogos florestais, 5 Dezembro, 2002
que não foram suficientes, como revela o elevado número de mortes, são teimosamente esquecidos. Na Austrália, que parece povoada por espíritos, a Natureza domina o homem que insiste em não ver os seus sinais.
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