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Pilar Olivares, 2008, Reuters
para ilustrar o artigo sobre a cimeira da APEC - fórum de Cooperação Económica que reuniu este fim de semana na cidade de Lima, no Peru, 21 países da Ásia-Pacifico. Em tempos de crise, as cimeiras internacionais sucedem-se, e de encontro em encontro, nas intermináveis horas de discussão e discursos, muitos são os políticos que não resistem e sucumbem ao cansaço.
Logo me lembrei desta fotografia,
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Erich Salomon, Ministros franceses e alemães na 2ºconferência de Haia, 1930
do fundador do fotojornalismo político moderno - Dr Erich Salomon, que ao “conseguir introduzir-se”, na segunda conferência de Haia (1930), fotografou ministros alemães e franceses a negociarem e discutirem noite dentro, o pagamento da divida de guerra alemã. Se no início desta sequência fotográfica,
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Erich Salomon, Ministros franceses e alemães na 2ºconferência de Haia, 1930
a discussão é acesa e o empenho de todos é visível, no final da noite, depois de muitas horas de negociação, mesmo sob a névoa do fumo dos charutos, poucos resistem acordados. Evidentemente ninguém gostava de ser surpreendido em flagrante delito de sonolência durante sessões tão importantes. Gustav Stresemann,
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Erich Salomon, Gustav Streseman com jornalistas no vestíbulo do Reichstag, 1928
o infatigável ministro dos Negócios Estrangeiros alemão acaba por confessar a Salomon: “Antes, podíamos ir à Sociedade das Nações e dormitar um pouco, mas depois que você se tornou fotógrafo, é terrível, nem ousamos fazê-lo, só o facto de saber que podemos ser apanhados em flagrante, mantêm-nos despertos”.
Perseverante, mesmo quando o acesso lhe era totalmente interdito, Salomon não desistia, e conseguia tirar sempre o melhor partido da situação como neste corredor do Hotel Beau Rivage na Suiça, em frente à porta da suite de Ramsay MacDonald,
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Erich Salomon, Hotel Beau Rivage, 1932
regista à esquerda o chapéu, bengala e luvas do chanceler do Reich e à direita os chapéus e casacos da delegação francesa.
Nada predispunha Salomon a tornar-se fotógrafo. Filho de um banqueiro de Berlim, regressado da guerra, viu-se obrigado a procurar emprego numa Alemanha em ruínas. Primeiro trabalhou na bolsa, depois numa fábrica de pianos e por fim montou um negócio de aluguer de automóveis, cuja publicidade original nos jornais, chamou a atenção da editora Ullstein, que o contratou em 1926 para trabalhar no seu grupo. Salomon o foto jornalista, como gostava de dizer recusando o termo de foto repórter, revela, através da sua observação brilhante e audaciosa, a vida dos políticos até aí inacessível ao público, abrindo um novo campo de acção ainda inexplorado do fotojornalismo.
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Erich Salomon, Berlim, num dia quente nos jardins da chancelaria reunião com Brüning, Agosto 1930
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Erich Salomon,Berlim, Conversa entre mulheres de políticos alemães, 1930
Com o seu dom inimitável para estar em todo o lado sem ser notado - a sua máquina Ermanox evitava que recorresse ao flash - Salomon surpreendeu os políticos do seu tempo, mas será o simpático Aristide Briand, o ministro dos Negócios Estrangeiros da França, que no quai d’Orsay o surpreende e denuncia: “Ah! le voilá! le roi des indiscrets!”.
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Erich Salomon, Paris, quai d'Orsay, Aristide Briand com outros dos seus ministros, Agosto de 1931
Finda a Primeira Guerra Mundial, perante a ruína e um povo desmoralizado e com fome, o imperador Guilherme II viu-se obrigado a abdicar. Para os alemães uma nova Constituição era a solução para a desordem endémica em que se encontrava o país. A 9 de Novembro 1918 era proclamada a República de Weimar, que nascia ensombrada com as elevadas indemnizações, que os aliados, através do Tratado de Versalhes impunham aos alemães. Que alternativa tinha a delegação que em Abril de 1919 era obrigada a assinar e não a negociar?
Depois de anos de turbulência, de quedas consecutivas de regimes de coligação,
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Erich Salomon, Berlim 1930, Eleição do presidente do Reichstag
em 1926 Stresemann, do Partido Popular, consegue que a Alemanha entre na Sociedade das Nações – uma grande vitória para a Alemanha derrotada. Em 1928, ano em que Salomon começa a fotografar, Stresemann
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Erich Salomon, Agosto de 1928, Gustav Stresemann no comboio para Paris
é apanhado a conversar na carruagem restaurante do comboio que o levará a Paris para assinar um novo acordo de paz internacional, o conhecido pacto Briand-Kellog. Briand promete a retirada das tropas francesas na zona esquerda do Reno e nesse mesmo ano Stresemann renegoceia as elevadas dívidas de reparação de guerra. Em 7 de Junho de 1929, um novo acordo é assinado entre a Alemanha e os aliados. A Alemanha compromete-se a pagar em tranches uma dívida que se prolonga até 1988. Se hoje nos parece absurdo, foi a solução técnica mais viável para o país, que acabou assim por não a pagar.
Em Março de 1930, com a morte de Stresemann e a Grande Depressão que se alastrava da América para a Europa, começava o fim da República. Ao olharmos para esta fotografia no Reichstag
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Erich Salomon, Berlim 30 de Outubro 1930, Os deputados do partido nacional-socialista em uniforme no Reichstag
temos a percepção de sermos mais um que assiste a uma sessão parlamentar: na bancada à esquerda os nazis fardados, os grandes vencedores das eleições de Setembro 1930, ocupam 107 lugares dos meros 12 que ocupavam depois das eleições de 1924.
Com a crise económica da Grande Depressão e o consequente retorno ao proteccionismo a indústria exportadora alemã entrou em falência. Desemprego, miséria e violência cresciam de dia para dia. Sequiosos de ordem e de um melhor nível de vida, foi fácil ao autoritário Hitler convencer os alemães que poria fim ao caos.
Judeu, Salomon viu-se obrigado a emigrar para a Holanda. Apanhado pelas tropas nazis é enviado para Auschwitz, onde morre, 1944, com a mulher e o filho mais novo.
“Erich Salomon le roi des indiscrets, 1928-1938”, está em exposição no Hotel de Sully do Jeu de Paume até 25 de Janeiro. Surpreendentemente, no ano em que o “Mois de la Photo”, tem como tema a Europa, a retrospectiva de Salomon, o fotógrafo que melhor retratou a Europa política do período entre guerras,
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Erich Salomon, Lugano, 1928, encontro de ministros de negócios estrangeiros. Da direita para a esquerda, Austin Chamberlain (Grã-Bretanha), Gustav Stresemann, (Alemanha), Aristide Briand (França) e de costas Vittorio Scialoja (Itália).
não está incluída na programação. Esquecimento?
Neste fim-de-semana em Lima, Luis Alberto Moreno do Banco Internacional do Desenvolvimento (BID), não se esquecendo do passado, proferiu no seu discurso o seguinte: “devemos preservar a abertura comercial que permitiu à América Latina entrar na economia mundial”.
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