
Na semana passada, recebi na minha caixa de e-mail a newsletter da photographie.com. Um dos temas em destaque “Yes Indeed”, a exposição de fotografia científica, agora em mostra na galeria Paviot em Paris. Graças a Photographie.com podemos visitar aqui “Yes Indeed”, onde Françoise Paviot, a galerista, nos serve de guia. “O espaço da galeria é pequeno e as fotografias imensas”, comenta Paviot, “optamos então por seguir o modelo expositivo em voga no século XIX, onde as paredes eram preenchidas de cima até baixo com as obras”, e pelo que podemos ver foi a solução certa, fantástica mesmo.
Se à microscopia e à astronomia se associava a exploração de mundos invisíveis e infinitos, à fotografia, um outro sistema óptico, associava-se o registo objectivo das realidades invisíveis e infinitas desses mundos. O mundo invisível dos microrganismos e o mundo infinito da astronomia, restritos ao homem das ciências, passavam agora a ser visíveis pelo homem comum pois através da imagem fotográfica, via-se aquilo que o olho não via. A fotografia, uma extensão da visão ocular, uma “prótese da visão”, como lhe chamou mais tarde Freud, ultrapassava os limites da fisiologia humana, e impôs-se desde cedo como corolário do percurso das tecnologias do visível.
No mundo invisível da microscopia, não foram só os microrganismos que foram fotografados. No hospital da Salpêtrière, o neurologista Jules-Bernard Luys publicava em 1873 a sua “Iconographie photographique dês centres nerveux”.

Mais tarde, Wilson Bentley, (1865-1931), passou meio século a fotografar a estrutura cristalina dos flocos de neve, fez milhares de microfotografias, para ser mais preciso, 5.381, e nunca encontrou dois cristais idênticos.

Só em 1986, o mistério deixou de o ser, e foram identificados dois cristais de neve idênticos. Na mesma época, no início do século XX, Karl Blossfeldt fotografava grandes planos de vegetais.

Tiradas de frente, verticalmente, sob fundo neutro, e uma luz indirecta, as plantas de Blossfeldt serviram de modelos ornamentais utilizadas pelas academias de arte. As entradas do metro de Paris, são um exemplo. Em meados do século, Harold E. Edgerton, um engenheiro do Massachusetts Institute of Technology (MIT), entretinha-se a investigar as novas técnicas de fotografia de “flash” electrónico de alta velocidade. Edgerton espantou o mundo com as suas fotografias que revelavam o que acontecia quando uma gota de leite pingava na superfície em repouso de um pires de leite. Na década de 50, não resistindo à cor, saturou de vermelho o branco do leite, e com a sua coroa de gotículas de leite formada no famoso “splash”, Edgerton estetizava a ciência.

Hoje, no século XXI, Michal Rovner, situa-se na fronteira entre o real e a ficção, entre a imagem fixa e a imagem em movimento, “ mas parto sempre da realidade” diz a artista israelita. Em 2005, o Jeu de paume em Paris apresentava a instalação “Data Zone”. Para ela os seres humanos tendem a criar ordem a partir da desordem e tais estruturas assemelham-se às culturas bacterianas, as “Data Zone”. Na sua instalação,


filma o movimento real de pessoas, que de mãos dadas, criam e simultaneamente destroem círculos que mais parecem universos de investigação laboratorial. Ciência? Arte? Cruzamento da ciência com a arte?
Deixemos os mundos invisíveis da microscopia e regressemos ao mundo infinito da astronomia, mundo que também foi registado intensamente pela objectiva da máquina fotográfica. “Mesmo a face da lua deixa o seu retrato na substância misteriosa de Daguerre” escrevia Alexander von Humboldt em 1839. Observar os eclipses do sol e da lua, eram fenómenos que suscitavam um enorme interesse. Olympe Aguado fotografou um eclipse da lua.

Em 18 de Julho de 1860, o eclipse total do sol foi fotografado em diversos locais. Warren De la Rue, fotografou-o em Espanha,

Aimé Girard, no norte de África fotografava o mesmo eclipse.

Já no século XX, em 1912, Joshua Benoliel, fotografava em Lisboa os populares vendo o eclipse do sol,

mas Benoliel quis também fotografar o lado científico, e deslocou-se ao observatório astronómico da Ajuda para tirar esta fotografia.

Mas a astronomia não são só eclipses, Jules Janssen , em 1874, fotografava a passagem artificial de Vénus sobre o sol.

A lua, que ao contrário do sol se deixava fotografar, interessou também os astrónomos. Lewis Rutherfurd, em Nova Iorque tirava esta fotografia da lua, estávamos em 1865.

Em 1953, quase cem anos depois, Girassol e os seus amigos, Tintim e capitão Haddock, embarcavam num foguetão “Rumo à Lua”, antecipando-se 13 anos a Neil Armstrong o primeiro a assentar os pés em solo lunar. Uma antecipação científica tão rigorosa só podia ser apoiada em documentação. Hergé, o famoso criador, disse o seguinte: “o que eu fiz em “Rumo à Lua” foi romanciar livros que já existiam como “A Astronáutica”, li muito antes de me lançar nesta história”. Mas hoje também se sabe que Hergé recorria à fotografia. O palácio Moulinsart, residência do capitão Haddock, foi desenhado a partir de fotografias.
Robert Doisneau, o fotógrafo humanista, fez também trabalhos de encomenda. Em 1942, em plena guerra, o editor Maximilien Vox preparava o livro “Les Nouveaux Destins de l’intelligence française”, encomendado pela autoridade de Vichy. O objectivo era celebrar o brilho e esplendor da ciência francesa. Doisneau, o fotógrafo escolhido. Em Ivry, no laboratório atómico onde trabalhavam os Joliot-Curie, Doisneau tirou estas fotografias.


Em 1942, os físicos evitavam a utilização do arco eléctrico porque isso correspondia a uma perca de energia, e a época era de contenção. Só depois, na câmara escura, Doisneau acrescenta um arco eléctrico imaginário entre as duas esferas.

Esta é uma imagem da banda desenhada "Rumo à Lua",


Fantasias de Hergé, ou um imaginário criado a partir das fotografias, também elas um pouco imaginárias? Cruzamento do mundo da fantasia com o mundo da ciência?
Em 1969, Apollo 11 aterrava na Lua e a NASA fotografava Neil Armstrong o primeiro astronauta a pisar solo lunar.


Fotografias da lua tiradas pela NASA, 1969
A NASA chegava onde só os astronautas chegavam, e nós na terra, especados em frente aos televisores, víamos o que nos era invisível.
Mas a fotografia científica não se reduz ao mundo invisível dos organismos, nem ao mundo infinito da astronomia, no próximo post, porque este já vai longo, revelaremos outros espantos da fotografia científica
A NASA chegava onde só os astronautas chegavam, e nós na terra, especados em frente aos televisores, víamos o que nos era invisível.
Mas a fotografia científica não se reduz ao mundo invisível dos organismos, nem ao mundo infinito da astronomia, no próximo post, porque este já vai longo, revelaremos outros espantos da fotografia científica
Sem comentários:
Enviar um comentário